Num sítio onde sempre se comeu bem resolvi ir espreitar o cozido à portuguesa. Desgraça total. Faltava quase tudo. Quando protestámos, o miúdo que servia à mesa, de ar assustado, que provavelmente não sabe mexer um ovo quanto mais como se faz cozido, correu à cozinha, voltando com três bocados de chouriço ordinário (no sentido de rasca, sintético, do piorzinho) num pires, murmurando “O cozinheiro diz que a farinheira se acabou”.
Eu sei que isto é arredores de Lisboa. No Minho esta casa já tinha fechado, no Porto ou em Chaves a equipa da cozinha tinha sido corrida. No Algarve, que já foi assim (e pior) as coisas têm vindo a mudar muito. No Alentejo, nas Beiras, na Bairrada, impensável uma cena destas. Lisboa, com os seus três milhões de almas, é o fim da fossa a céu aberto onde desaguam todos os incapazes do resto da nação. Abrem uma loja de pronto-a-qualquer-coisa e servem quiches com sabor a nada, bitoques de palha ao pé dos quais um Big Mac é comida de gourmet, roupas da treta, objectos inúteis.
Os bons, por vezes, é pior: vão-se embora daqui. Em Sete Rios funcionou durante anos um lugar simples e esplêndido, o “Rio Minho”, onde se comia fantasticamente. Os donos regressaram ao Minho e abriram, dizem-me, um restaurante com trezentos lugares. Ao lado do “Rio Minho”, conterrâneos dos primeiros mantêm o mesmo nível de culinária portuguesa, simples mas perfeita: cabidela, rojões, carapaus fritos com açorda, vinho verde à pressão e aguardende de vinho verde produzida por eles. Resistem heroicamente – apesar da casa cheia aos almoços e ao sábado, o prédio está a cair. Espero que não se vão embora. Eu e muitos precisamos deles. E tenho de ir a Monção à procura dos outros.
É claro que se come muito bem em Lisboa e arredores. Contudo, dói ver afundar-se um sítio a que estamos ligados. É como se nos afundássemos um pouco com ele.
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