24 de novembro de 2008
Sítios por onde andou
O pretexto era a comemoração dos 40 anos do “White Álbum”, ou se preferirem o duplo “The Beatles”. Nunca entendeu muito bem o entusiasmo dos incondicionais dos Beatles para com este álbum. Terá de dizer agora que, fugindo um pouco, aos da sua geração, nunca Os Beatles o levaram ao entusiasmo. Para ele os Beatles são três bons álbuns, “Sgt. Pepper´s Lonely Hearts Club Band”, “Revolver”, “Abbey Road e mais uma dúzia de dispersas canções, nada que o leve a considerar-se um incondicional.
Mas qualquer pretexto é bom para estar com velhos amigos, tirar o pó à nostalgia. Sim velhos… não tanto muito velhos mas o suficiente para que se comece a ver que está a fazer-se tarde, assistir ao gesto de sacar dos óculos de ver ao perto para ler a ementa. O Gabriel Garcia Marquez diz que terceira idade é aquela em que a gente põe os óculos para ouvir o rádio. Mas até aqui, ainda, não se chegou, mas para lá se caminha.
O tropel dos dias que passam, o deixar de morar na cidade, leva a que, aos poucos, se vão perdendo os convívios, vão-se perdendo os contactos. Daí o arranjar estas datas redondas de acontecimentos para um encontro.
A comezaina foi marcada para um tasquinho, boa comida caseira, para os lados do Poço do Bispo. Um sábado de sol e calorzinho, de fazer inveja a qualquer Primavera que se preze e estamos tão só a caminho do Inverno. Há muito que não ia para aqueles lados, terras de operários, indústrias e comércios vários., armazéns de vinhos, mas já não se vêem nem as quintas nem as hortas. Sessões de domingo no velho “Cine-Pátria”, o subir da Azinhaga dos Alfinetes para ir ver o Glorioso ao Estádio Engº Carlos Salema, casa do Clube Oriental de Lisboa, o velho C.O.L.
Eis quando viu, junto a uma enorme ribanceira escarpada, no meio de vegetação e canaviais, um barco. O rio está perto, mas como raio o barco foi ali plantar-se no meio de um emaranhado de ruas. Roubado e abandonado? Apenas estacionado pelo dono que por perto deve morar? Não interessa assim tanto. Achou apenas graça ao barco dentro da cidade.
Como se esquecera de levar a máquina, pediu a fotografia emprestada ao “Ié-Ié”.
Para além do convívio, da beleza da tarde de sábado soalheiro, aquele barco marcará a memória do dia em que, uma série de guedelhudos grisalhos e outros já descapotáveis, comemoraram os quarenta anos do “White Álbum”.Em terra de operário, indústrias e comércios vários, o cheiro a maresia que vem lá do rio, a ideia roubada a Karl Valentin de que “antigamente o futuro era muito melhor” e este poema de Al Berto, “Incêndio”, de que se lembrou de repente, nem sabe bem porquê - e que interessa isso? – mas talvez por esse barco na cidade, barco que esqueceu o mar, ali no silêncio da tarde de um sábado.
”se conseguires entrar em casa e alguém estiver em fogo na tua cama
e a sombra duma cidade surgir na cera do soalho
e do tecto cair um chuva brilhante
continua e miudinha — não te assustes
são os teus antepassados que por um momento
se levantaram da inércia dos séculos e vêm
visitar-te
diz-lhes que vives junto ao mar onde
zarpam navios carregados com medos
do fim do mundo — diz-lhes que se consumiu
a morada de uma vida inteira e pede-lhes
para murmurarem uma última canção para os olhos
e adormece sem lágrimas — com eles no chão”
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3 comentários:
Retenho a presença insólita do barco e, comparando memórias, evoco uma imagem - esta menos pacífica - de um tanque de guerra colocado em zona central de Luanda (que só conheci enquanto país independente) sobre o pedestal onde outrora assentava a estátua de uma revolucionária provinda da cultura colonial. Contam os "antigos" que se tratava de uma representação figurativa da Maria da Fonte.
Os mais irónicos afirmavam: "foi-se embora a Maria da Fonte e passámos a ter a Maria do Tanque".
Mas tudo isto não é complicado se pensarmos nas hipóteses que explicam a construção das pirâmides no antigo Egipto.
(que conste,a geração Pink Floyd, Deep Purple, Yes, Genesis, etc. não tende a comemoração de efemérides):)
Ahem. Teresa, há três anos houve uma celebração de arromba dos trinta anos do concerto dos Genesis no Pavilhão de Cascais (5 e 6 de Março de 1975) - estiveram em Lisboa os Musical Box,uma banda especializada na recriação dos concertos dos Genesis em pormenor molecular. Foi na Aula Magna, a rebentar pelas costuras de malta com cinquenta e tais e das respectivas proles.
Vai havendo umas celebraçõezitas, sim, que não somos diferentes de quem nos antecedeu nem dos que se seguem...
:)(para o comentário do ABS)
para mim, o concerto de 75 foi para esquecer, cheguei tarde ao "Dramático de Cascais" e ainda por cima tinham vendido bilhetes falsos, quem conseguiu entrar com a lotação mais do que esgotada tem alguns episódios "acidentados" com direito a nódoas negras e saudação de "rajadas" à entrada :(
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