28 de novembro de 2006

Em tempo de Alertas

Terminou hoje – acho eu – o alerta laranja. Passadas as chuvadas e os ventos, terminadas as cheias e derrocadas, contabilizadas as pequenas tragédias individuais, o país suspira de alívio e volta à costumeira rotina. E os telejornais poder-se-ão ocupar novamente do pequenino do PSD, para descanso do Carlos!

Mas não se iludam, daqui a nada chega o Natal, as viagens e os acidentes… e logo entraremos noutro alerta. Depois vem Janeiro e, de certeza, uma enorme vaga de frio… conclusão, alerta amarelo! Lá para o Verão, hão-de vir os nossos incêndios e a habitual vaga de calor… logo, alerta vermelho! Depois chega outra vez o Outono, com as gripes e as migrações dos gansos patolas… alerta azul, de certeza. Qualquer dia nem a pacata Primevera se escapa, há-de aparecer uma extraordinária vaga de pólens – ou terríveis enxames de abelhas – e alerta-se logo o pessoal.

Com isto não julguem que acho estes alertas despropositados e desnecessários. Não, acho que são normais e têm como objectivo activar as estruturas de protecção civil necessárias para uma situação específica. Agora toda esta histeria pseudo-jornalistica – que se pega às pessoas – deixa-me completamente desatinado. Não bastava fazer os avisos essenciais, dar as notícias relevantes? É preciso ir à Regueira do Tua ou aos Palheiros do Sobral, mostrar a cabana que ardeu, a cave que se inundou, a senhora que chorou, a criança que gritou, o pobrezinho que perdeu o que não tinha…? E antecipar – ou adivinhar - que muito pior deve estar para vir?

Ainda por cima, acho que as televisões nos aldrabam… acho que elas têm oito ou nove figurantes contratados, que andam sempre com as equipas de reportagem da catástrofe, e fazem os lamentos e choradinhos que se querem ouvir. De certeza… De certeza que o homem de bigode e olhos esgazeados que geme pela cabana que ardeu é mesmo que chora pela cave que se inundou. De certeza que as 2 cabras que esturricaram em Palheiros do Sobral são as mesmas que se afogaram na cave de Regueira do Tua.

Tudo isto me perece estranho e excessivo. Não vejo nenhum sentido em todo este alarido. Está muito para além de toda a razão e lógica… É completamente surreal!

E como, assim por acaso, me lembrei do Surrelismo (Estão a ver onde quero chegar…?), aqui deixo a minha singela homenagem a M. Cesariny.

Faz-me o favor de não dizer absolutamente nada!
Supor o que dirá
Tua boca velada
É ouvir-te já.

É ouvir-te melhor
Do que o dirias.
O que és nao vem à flor
Das caras e dos dias.

Tu és melhor -- muito melhor!--
Do que tu. Não digas nada. Sê
Alma do corpo nu
Que do espelho se vê.

Faz-me o Favor, in “O Virgem Negra”

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