Fiquei a saber este ano que o guia turístico da Lonely Planet para Portugal diz que não se deve pedir direcções a portugueses porque estes (nós) quando não sabem NUNCA dizem que não sabem. O que fazem é dizer sempre qualquer coisa mesmo que nada ajude. A boa intenção vale mais do que evitar confusão e perda de tempo a quem pergunta.
No Verão passado 4 dos meus amigos internacionais confirmaram-me que nunca um português lhes havia dado como resposta nem "não" nem "não sei" mas que isso nunca os tinha ajudado por aí além (antes pelo contrário).
Então, eu próprio comecei a olhar para mim mesmo e para as minhas atitudes a tentar descobrir se também dava uma resposta qualquer quando não sabia. Eu já sabia que tinha muita dificuldade em dizer não fosse a quem fosse a respeito do que quer que fosse. Mas ainda não tinha reparado na minha atitude quanto ao "não sei". O resultado foi que ainda não sei se costumava ou não declarar o "não sei" aos outros.
Este ano decidi por experiência e por eficiência começar a usar as respostas "não" e "não sei". Tenho utilizado essas respostas com os meus clientes. As conclusões (ou os resultados) apresento-os de seguida.
Admitindo que os meus clientes são uma amostra representativa da população portuguesa, o uso da resposta "não" deixa os portugueses em estado de choque ou então deixa-os perplexos. Num país em que nada são dificuldades e em que há solução para tudo, a resposta "não" tinha necessariamente de ter este efeito: a estupefacção, o não querer acreditar no que se acaba de ouvir.
A utilização do "não sei" deixa as pessoas (portuguesas) confusas e incrédulas. Em geral os portugueses não acreditam que se lhes possa responder um "não sei" com seriedade. Esta tarde, por exemplo, uma cliente minha colocou-me uma pergunta e respondi-lhe "não sei". Ela repetiu a mesma pergunta de quatro maneiras diferentes mas a minha resposta continuava verdadeira desde o princípio. A verdade era esta: "não sei".
As pessoas mais velhas e muito idóneas em matéria de educação (estou agora a pensar em pessoas que amo) disseram-me que pelo menos devia acrescentar ao "não" um "desculpe mas" ou um "lamento que". Não concordei: no acrescentar desse quase pedido de desculpa vai implícito que dizer "não" é em si algo menos próprio, menos correcto ou até ofensivo. E aí reside o problema das pessoas portuguesas: é pensarem ou sentirem que um "não" é, em última análise, qualquer coisa de hostil e que, portanto, ou não se aceita, ou só se aceita acompanhado de um pedido de desculpas.
Aquilo que os portugueses não sabem é que o "não" é tão necessário e tão provável como o sim (excepto para os optimistas, aqueles que dispõem da magia de transformar os "nãos" em "sins"), e que o "não" ou o "não sei" permite poupar muito tempo - sobretudo a quem pede informações ou deseja encontrar sapatos 43.
Nas culturas mais assertivas e mais pragmáticas ninguém se ofende com um "não": todos reconhecem que o tempo dos outros deve ser respeitado e que portanto não se deve criar falsas expectativas com "talvezes" infundados e "parece-me que" desnecessários. Mas não é só o respeito pelo tempo que é mais importante para essas culturas. É a noção de que a minha liberdade de expressão permite-me negar e que essa atitude é tão razoável e normal como a de concordar. E é ainda a noção de que não estar de acordo não tem de ter relação nenhuma com ser hostil. E é, finalmente, a noção de que se ganha tempo e de que é bom ser franco e directo.
Ricardo
Sem comentários:
Enviar um comentário