A M. deu ontem o seu primeiro recital . Se a memória não pregar partidas, terão decorrido 4 anos desde que, em época natalícia, ostentou com um sorriso o saxofone oferecido pelo Natal. Mesmo sabendo da ligação que pais e irmão têm à música fiquei , na época, a pensar quão difícil deveria ser a aprendizagem de tal instrumento.
Em Novembro passado, chegou o convite para a ouvir – acompanhada por um grupo de colegas e respectivo professor – num bar-cave situado em zona residencial da cidade, algumas versões muito criativas de clássicos como Wave ou In a Mellow Tone.
O grupo era restrito, o local, com valências múltiplas (oficinas várias, teatro, performances), dificilmente se descortinava no meio de prédios de habitação da pequena Rua Maria. Pertencendo à geração do Cascais Jazz, nunca perdi o acontecimento (anos houve em que todos os dias de concerto eram para marcar presença) e bem cedo interiorizei a ideia de que esta música liga bem com caves e espaços mais restritos (assim como que uma espécie de “jazz de câmara”).
Em boa hora chegou o convite para a apresentação do seu trabalho, na noite de ontem, no bar da Orquestra Metropolitana de Lisboa. Estavam muitos amigos da mesma geração da jovem, avó, pais, colegas e amigos dos pais… o sorriso que ostentou para cada um foi de alegria sincera ao ver presente uma assistência que tanto a estima e valoriza.
Os primeiros temas ficaram a cargo de alguns jovens do Hot Clube: um DJ acompanhava o primeiro grupo de músicos e, apesar de se tratar de um projecto inovador, pareceu-me- leiga na matéria – que o desempenho do DJ se sobrepunha ao dos restantes músicos.
Chegou a vez da M. com o seu grupo de colegas: a simplicidade e o fascínio do som, os clássicos de Jobim numa interpretação pessoal e marcante.
A melodia, a voz discreta mas segura da vocalista, o desempenho ao sax de uma menina de aparência frágil, mas com uma garra que se contrapunha ao aspecto da intérprete, deixaram em suspenso a assistência.
O momento alto foi quando a M., com a vozinha suave que a caracteriza, disse ao microfone com um ar envergonhado: “é o meu recital e, por isso mesmo, pedi ao meu pai que me acompanhasse num tema”. E a magia aconteceu: o pai, de presença (sempre) discreta, escondeu-se por detrás do piano e toda a audiência que até então se mostrava descontraída e em conversa de circunstância acabou por emudecer.
No final, este pianista (por hobby mas, em opinião pessoal, a superar muitos que fazem da música o seu quotidiano) disse em tom bem-humorado: “e fico-me por aqui, pois a medicação para o reumático deixou de fazer efeito”.
Tenho a certeza de que esta menina ainda irá ficar conhecida de um público mais vasto, caso outros projectos profissionais não a venham a afastar da música. Para bem de todos nós espera-se que tal não aconteça.
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