12 de abril de 2006

Os Poemas

em vez de um... vão dois.

o primeiro que me lembro de gostar de declamar, e quase decorei por inteiro, é de Mário de Sá-Carneiro & chama-se Fim:

«Quando eu morrer batam em latas,
Rompam aos saltos e aos pinotes,
Façam estalar no ar chicotes,
Chamem palhaços e acrobatas!

Que o meu caixão vá sobre um burro
Ajaezado à andaluza...
A um morto nada se recusa,
E eu quero por força ir de burro!»

grandes discussões se geraram no velho KGB entre os cultores de Fernando Pessoa & os cultores de Mário de Sá-Carneiro.

posteriormente descobri Alexandre O'Neill & fiquei fan d'O Poema Pouco Original Do Medo:

«O medo vai ter tudo
pernas
ambulâncias
e o luxo blindado

Vai ter olhos onde ninguém os veja
mãozinhas cautelosas
enredos quase inocentes
ouvidos não só nas paredes
mas também no chão
no tecto
no murmúrio dos esgotos
e talvez até (cautela!)
ouvidos nos teus ouvidos

O medo vai ter tudo
fantasmas na ópera
sessões contínuas de espiritismo
milagres
cortejos
frases corajosas
meninas exemplares
seguras casas de penhor
maliciosas casas de passe
conferências várias
congressos muitos
óptimos empregos
poemas originais
e poemas como este
projectos altamente porcos
heróis
(o medo vai ter heróis!)
costureiras reais e irreais
operários
(assim assim)
escriturários
(muitos)
intelectuais
(o que se sabe)
a tua voz talvez
talvez a minha
com certeza a deles

Vai ter capitais
países
suspeitas como toda a gente
muitíssimos amigos
beijos
namorados esverdeados
amantes silenciosos
ardentes
e angustiados

Ah o medo vai ter tudo
tudo

(Penso no o medo vai ter
e tenho medo
que é justamente
o que o medo quer)

************

O medo vai ter tudo
quase tudo
e cada um por seu caminho
havemos todos de chegar
quase todos a ratos

Sim
a ratos»

Sem comentários: