Como explicar...às vezes o meu trabalho implica ver Lisboa morrer pouco a pouco. Ver moradores desalojados.
Casas lindas, com vistas magníficas, em locais recônditos...ou não. Que vão caír ou arderam.
Apanho sempre situações de velhinhas e velhinhos que me arrepiam. Casas com buracos nos tectos, rachas na parede, divisão que já não se usa por não ter condições de habitabilidade. E depois os despojos do passado. Dizia o outro, a espuma dos dias. É uma espuma acinzentada, que faz arder os olhos e traz um tremendo gosto a amargo. Retratos antigos, calendários muito amarelados, móveis dispersos, há como que um modelo de decrepitude. E no meio disso tudo, uma velhinha de 93 anos, sozinha por completo e de nome Carolina, que se desculpa por não saber ler. E que olha para nós com uma tremenda esperança, quando sabemos que inevitavelmente a vamos decepcionar.
E chove, o cabelo emaranha-se, estás cansada e com fome, apetece-te o aconchego da tua casa.
Não, não se esquece. Fica tudo cá dentro.
A tristeza só não escorre, porque não se torna líquida.
Abeijos e braços.
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