6 de abril de 2004

ainda o Pablo Conejo "Eu não tenho complexo. Eu sou um ótimo escritor. Um ótimo escritor."

Leiam a entrevista que ele deu à revista Veja e tirem as vossas conclusões (eu sei que é um bocadito grande mas vale a pena)

Veja; Seus livros têm falado cada vez menos de esoterismo. O senhor ainda se considera um mago?
Coelho ; A idéia do mago é muito mais uma questão de percepção do universo. É uma maneira de olhar o mundo além da realidade concreta.
Mas eu tenho vários livros que não tocam em magia. Meus livros falam
de questões filosóficas.
Veja – Seria esse o ponto comum entre eles, na sua opinião?
Coelho – O ponto em comum é uma coisa chamada estilo. Do meu primeiro livro até agora, eu tenho mantido um estilo que é absolutamente direto, enxuto. Vou cortando, cortando, até chegar à essência da coisa. No começo, isso foi mal interpretado. Achavam que era uma coisa superficial. Mas é essa característica que dá aos meus livros o seu aspecto único.
Veja –; Depois de tanto sucesso, as críticas ainda o incomodam?
Coelho – Eu sou um autor muito polarizador: as pessoas me amam ou me odeiam. Estou acostumado. Mas a única crítica que me magoou não foi dirigida a mim. Foi quando disseram que meu leitor era burro. Eu não quero generalizar, mas existe um fascismo cultural no país.
Veja – O senhor se sente perseguido por ele?
Coelho – Acho que são perseguidos por ele todos os que não se enquadram num certo padrão, que é o de valorizar o que é incompreensível e inacessível. Só que, felizmente, isso só vale para a crítica, que se isolou da realidade. As pessoas que escrevem esse tipo de coisa ficam numa torre de marfim, sem saber o que se passa em torno delas. Acham que estão abafando, que está todo mundo escutando o que elas dizem. Só que não sabem que ninguém dá ouvidos a elas. De
que adianta um livro que impressiona mas que não é lido? O que eu disse sobre James Joyce é verdade: ele é ilegível, ilegível.
Veja – Mas livros como Ulisses e Finnegans Wake, de Joyce, são considerados marcos do modernismo, talvez dos mais geniais do século
XX. O senhor acha que a sua obra irá sobreviver também?
Coelho – O fato de uma obra sobreviver não quer dizer que ela seja lida. Eu tentei ler Ulisses, não consegui e achei que era burro. Só que eu não sou burro, Ulisses é que é ilegível. Mas as pessoas se
acovardam muito para falar dessas coisas. Você tem sempre de passar a
idéia de que entendeu tudo. E a culpa não é sua, a culpa é dos caras
que escreveram. Eles têm a obrigação de ser claros. Burro é quem não
sabe se explicar. Mesmo um livro como Sidarta, do Hermann Hesse, é
uma coisa mal-acabada. O cara não soube acabar o livro, entendeu?
Termina com aquela frase: "Tem que olhar o rio". Que rio, pô? Acho
que o Hermann Hesse não sabia como terminar o livro e meteu essa
história aí de rio.
Veja – Hesse é um prêmio Nobel...
Coelho – Sim, mas eu tenho direito de dizer isso sobre ele, até porque foi um escritor que me marcou muito. O fato de Sidarta acabar
mal não invalida o resto do livro.
Veja – Houve uma época em que o senhor dizia que era capaz de
promover magias como fazer ventar, por exemplo. Hoje se arrepende
dessas declarações?
Coelho – Não me arrependo, porque isso é verdade.
Veja – O senhor pode fazer ventar agora?
Coelho – Não, não faço mais. Isso é bobagem. Não preciso mais fazer
demonstrações públicas.
Veja – E magias em benefício próprio? O senhor dizia que costumava abrir o trânsito com a força do pensamento. Ainda faz isso?
Coelho – Não, de jeito nenhum. Não vou gastar energia com isso. Já fiz, já passou.
Veja – Não fica mais invisível, como dizia ficar?
Coelho – Não, isso é inútil. Gasto minha energia em outras coisas agora.
Veja – Então, o senhor abriu mão da magia?
Coelho – Talvez desse tipo de magia. Acho que faz parte do aprendizado brincar um pouquinho. Depois, tem de falar sério.
Descobri que essas coisas não são importantes. Esse negócio de fazer
chover, por exemplo. Pô, o que que isso vai me ajudar? Além disso, já
cheguei a dar três grandes demonstrações públicas do que eu sou capaz
e acho que basta.
Veja – Quais foram elas?
Coelho – Uma foi para o jornal O Globo, em 1987. Eu disse que fazia ventar, a jornalista pediu para fazer e eu fiz [na reportagem
mencionada, a jornalista não pede ao escritor que faça ventar. Relata
ter ficado impressionada com o fato de uma forte ventania ter
ocorrido logo após ela ter perguntado se ele era de fato um mago]. A
segunda foi para a Marília Gabriela, assim que o presidente Fernando
Collor foi eleito. Ela me perguntou como seria o seu governo. Eu
disse: daqui a dois anos ele se ferra [a apresentadora informou, por
meio de sua assessoria, que o episódio não ocorreu em seu programa].
A terceira foi quando o Jô Soares me perguntou se eu sabia o nome do
namorado da Zélia [então ministra da Economia, que teve um romance
com o colega Bernardo Cabral]. Eu dei as iniciais [o apresentador
disse que nunca perguntou a Paulo Coelho o nome do namorado da ex-
ministra. Informado de que o próprio escritor havia relatado o
episódio, disse que talvez não se lembrasse].
Veja – É uma etapa ultrapassada, então?
Coelho – Digamos que foi um período de brincadeira, e brincar é
permitido a todo mundo, até porque a vida é muito lúdica. Eu não tiro
o valor dessa época em que via essa coisa da magia até com um certo
deslumbramento.
Veja – O senhor não se considera mais um mago, portanto?
Coelho – Vou me considerar a vida inteira, mas não no sentido
esotérico, isso eu nunca me considerei. É no sentido de uma percepção
que os seres humanos têm... Aí ficou essa coisa de mago. Mas eu serei
lembrado, se for lembrado, como escritor.
Veja – O que fez com que o senhor desistisse de sua candidatura à
Academia Brasileira de Letras?
Coelho – Foi um sinal. Não foi medo de perder para a Zélia Gattai, não foi nada disso. Foi exatamente assim: na terça-feira, dia
seguinte à morte de Jorge Amado, fui dormir candidato. Tomei café da
manhã candidato e fui andar na praia. Fui andar já para me programar
para essa tarefa: teria de cancelar alguns compromissos no exterior,
começar a fazer as visitas, todo aquele ritual da Academia. Mas, na
hora em que eu sentei na areia para fumar um cigarro antes de andar,
veio aquilo: "Não se candidate".
Veja – Uma voz?
Coelho – Não, não foi uma voz. Foi um sinal interior muito claro. E eu decidi obedecer, mesmo contra a minha vontade.
Veja – O senhor chegou a receber manifestação de apoio de algum acadêmico?
Coelho – Nem de apoio nem de hostilidade.
Veja – O que o atrai na possibilidade de tornar-se um acadêmico?
Coelho – O que me atrai é a possibilidade de diálogo. A Academia é um lugar onde você vai encontrar pessoas inteligentes, de todo tipo de
tendência. Existe esse convívio, esse diálogo do qual eu sinto
vontade de participar.
Veja – E existe também o fato de que isso significaria o seu
reconhecimento enquanto escritor?
Coelho – Tem tudo isso. A Academia é um lugar muito respeitado no
Brasil. Tanto é que todo mundo quer entrar para a Academia.
Veja – O senhor não se acha devidamente respeitado?
Coelho – O respeito principal eu tenho, que é o respeito do meu
leitor. E não tenho complexo. Eu sou um ótimo escritor. Um ótimo
escritor. E sou vanguarda.
Veja – Quais as características de sua obra que a fazem ser vanguarda, na sua opinião?
Coelho – Primeiro, o fato de ela ser rejeitada pelo sistema
acadêmico. E depois o fato de o público gostar dela. Porque o público
sempre pensa à frente.
(...)

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