Lembro outros tempos: os cuidados com aquilo que se dizia e a quem. Lembro outros tempos: alguns discos ouvidos em casa, às escondidas, sobre o absurdo de uma guerra (de todas as guerras). Lembro outros tempos quando, no liceu, uma colega de dezasseis anos desapareceu, durante uns dias, (para ser ouvida numa esquadra, dizia-se, pois o irmão mais velho distribuía propaganda dita subversiva). Lembro outros tempos: testemunhos de familiares que, ao saírem do trabalho, num qualquer dia 1 de maio viram, pelo chão do Rossio, panfletos com a simples frase «aguentas, Zé?» e, compondo o cenário, uma carga policial cega, sobre quem passava. Por lembrar outros tempos, mesmo em dias de desencanto e de incerteza, tanto valorizo a existência do direito ao voto (branco, azul, anulado, útil), seja qual for a opção de cada um, mesmo em tempos nos quais pouca confiança nos inspiram muitos dos candidatos. Quanto mais não seja, por isso, mesmo em desconforto, nunca deixei de votar.
Poetas andaluces
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