2 de setembro de 2010

Com Maputo no pensamento

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(imagens: oficinasdesociologia.blogspot)

De olhos secos e a disfarçar conversas, sempre que um Verão finda, vejo sólidas (e que falta fazem!) amizades rumarem a Maputo para se dar início a um novo ano escolar. Desta vez, a primeira jornada de uma amiga de décadas, estreante nestas lides, dado tratar-se da sua primeira incursão por terras africanas. Fiquei contente, pois iria conseguir a tão merecida estabilidade profissional (e os alunos certamente ganharão com isso) , embora a parte egocêntrica me tenha feito ficar a pensar em tantos momentos bem-humorados, peças teatrais vistas em conjunto, imensas caminhadas pela nossa bonita vila, visitas à feira saloia de Almoçageme a tornarem-se memória viva em cada soalheira manhã de sábado…
Ontem bem cedo (por lá dá-se início ao horário lectivo às 7.30), uma mensagem na caixa de correio: «estamos bem, embora lá fora soem tiros e receemos sempre por vítimas, sobretudo pelos mais indefesos. A escola fechou e os miúdos foram levados, em segurança, para casa. A família mais chegada daí ainda não sabe de nada, para que não haja alarmismos e preocupações. Mesmo longe, não imaginas quanto estás presente».
Habituada, no passado, a pequenas revoltas (e episódios com certas particularidades em comum que me absterei de esmiuçar) em latitudes igualmente distantes, desvalorizei um pouco a questão. Ao fim do dia e em frente às imagens televisivas, comecei a ficar apreensiva…
Bonita a onda de solidariedade gerada, pois a seguir ao telejornal começou a chuva de mails e sms por parte de quem está mais próximo: «Sabes da L? E da R? Estarão bem?» houve mesmo alguém que conseguiu uma chamada telefónica e de imediato avisou os restantes. Na manhã de hoje continuei a ser inquirida e não me surpreendeu a infinidade de amigos que por cá se preocupam. A amizade é assim... Dou comigo a pensar que, mesmo tendo sentido revolta ao ver jovens feridos e ouvir nas notícias o número de vítimas mortais, a preocupação inicial vai de imediato para aqueles que connosco tanto têm partilhado de bom ao longo da vida. Não pensava deixar reflexão escrita sobre a recente vivência, mas a mesma surgiu após ter encontrado num antigo JL acabado de folhear , uns versos de José Luís Peixoto quando era ainda adolescente. Não receando ser apelidada de «lamechas» (só muito pontualmente), a primeira preocupação vai para os «nossos» em locais conturbados, o que traz à memória este tema de Jacques Brel. E sim, importa que morram crianças!

Que importa se morrem?
Que importa se crianças,
De barriga grande, deitam espumas
De tantas cores pelas bocas?
(…)
José Luís Peixoto, (JL, 14 de Abril de 1992)

2 comentários:

ABS disse...

Hoje, dia 3, parece já haver algum sossego. Esperemos que se mantenha.

teresa disse...

A impossibilidade de comprar os bens essenciais é má conselheira... últimas notícias de amigos «a cidade encontra-se estranhamente calma».