26 de setembro de 2009

ESTE DOMINGO DE ELEIÇÕES

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“Este domingo, quando pisar de novo o cascalho solto da escola do meu bairro, vou pensar no trilho de pó na picada do Zala, vou pôr à frente dos olhos o esgar da morte no rosto lavado do Borba, naquele morro do Hinda.
Este domingo, ao declarar o meu nome de cidadão que o 25 de Abril libertou, vou passar em revista, uma a uma, memórias das noites solitárias de Nambuanagongo, quando as hienas vinham ao arame, ao cheiro do coval fresco no cemitério sempre em crescimento.
Este domingo vou poisar com amor a minha mão no ombro do meu filho Pedro e garantir-lhe que o “Vera Cruz” está na sucata.
Este domingo, sim, este domingo, vou limpar na minha mesa o pó do quadrado onde antes esteve instalado o telefone que ditava as ordens do lápis azul, na voz baça do alferes Cirne.
Mas também, claro, este domingo o meu risco azul num quadrado inesperado, (mais “talvez” do que “sim”, mais “cabeça” que “coração”) não é assinatura reconhecida da minha desistência.
Porque, neste domingo, eu estarei de vigília pelas noites em que as Chaimites saíram à rua e as fardas se puseram, por um instante de História, sempre, sempre ao lado do povo.”

Manuel Beça Múrias em “Mundos e Fundos, Crónicas de Paixão e Maldizer”
E publicada anteriormente em “O Jornal” 5.12.1980

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