29 de fevereiro de 2008
Se amanhã estiver sol, baldo-me para estes lados. Com a Nico na mala, claro (mais fino este nome do que o original). Depois festa de anos com comidinha africana! Miam!
Pensei, depois de ter lido com atento respeito esta sábia literatura, que poucas verdades seriam tão profundas como aquela, pelo menos com respeito a Lisboa. Com efeito, basta considerar o nosso vasto esqueleto urbano para se verificar que o relator tem evidentes razões técnicas. Começando pelo Braço de Prata, pela Perna de Pau e pelo Cabeço da Bola, o próprio povo , no rolar dos séculos, se encarregou de informar-nos claramente que vivemos (cheia de marrecas) sobre uma capital de corpinho bem feito.
Da Travessa da Cara à do Pé de Ferro e da Bica do Sapato, à do Cotovelo, ao Pátio do Tronco, à Bacia do Tejo e à Linha de Cintura, às grandes artérias e às gargantas de São Roque e Das Amoreiras - tudo completo, com a Rua do Assento, o Cais da Lingueta, e o Casal dos Ossos, (à rua das Casas de Trabalho), um autêntico e modelado corpo humano, com toda a sua anatomia descritiva. E nem lhe falta mesmo o adorno capilar do Caracol da Graça, dos Barbadinhos, dos Becos da Cabeleira a S. Bento e do Capachinho à rua do Costa, os Casais de Mal-Penteado a Carnide e do Pai-Calvo a Caselas.
Lisboa tem, evidentemente, além de uma alma que os fadistas cantam, um corpo a que não faltam corcundas nas encostas, e vegetação abundante em várias regiões - Tapadas, evidentemente."
Leitão de Barros, "Os Corvos"
Fotografias
Pozal, Fernando Martinez Travessa do Pé de Ferro
Serôdio, Armando, Escadas do Caracol da Graça
Portugal, Eduardo Pátio do Tronco
Março, marçagão..
28 de fevereiro de 2008
Carta XII
Depois que me dissestes que eu faço bem huma cartinha não sey escrever. Ha mais de meya hora que imagino em faser esta, e quanto mais me anímo para merecer os louvores que me daes quanto mais vejo que mos não deveis. Mil cousas vos dissera agora desta qualidade, porem em lugar de todas ellas vos digo somente que a minha viagem está disfeita. Não cuideis que me fiqueis em obrigação, porque a resolução nesta materia procedeo mais do acaso que da diligencia.Se dos interesses que tiro de ficar aqui posso contar algum verdadeyro, será somente o da satisfação de saber que vos alegraes com esta noticia. Day-me as vossas, e disey-me se vindes hoje à Assembléa.
Vosso Criado, e A
Vienna de Aústria, 6 de Março de 1738
F. X. D.O
Francisco Xavier de Oliveira, in Cartas, tomo III, Lisboa 1855
a pedido de várias famílias, o célebre 444
há marcas que atravessam gerações.
conhecemo-las dos nossos pais ou de publicidade em revistas antigas e, por casualidades, tropeçamos nelas ainda à venda.
o creme 444 é um desses magníficos produtos.
comercializado por uma empresa de gaia (ferreira augusto, lda) tem, ainda hoje, uma pequena legião de admiradores confessos.
se o cutoline de que vos falei aqui 'à atrasado' (como se diz por estas paragens...) trata de estancar o sangue dos cortes imprevistos, o 444 trata de dar à pele uma suavidade inegualável.
dizem.
como sabem, eu não sou a melhor pessoa para o confirmar já que a minha pele está coberta de pelos na zona onde este gel é mais recomendado.
mas prometo fazer o teste (um ano destes...).
O eléctrico anfíbio
Claro que este postalinho é para o Mercado de Bem-Fica, um excelente blogue, ainda no seu início, sobre Benfica.
Fotografia:Inundações, 1946
Fotografia de Ferreira da Cunha
(estrada de Benfica)
Macau para a Sofia
27 de fevereiro de 2008
Professores
Talvez esta coisa dos professores irritados deixe de me aborrecer quando eles deixarem de criticar aqueles que os querem obrigar a justificar o dinheiro que ganham.
Infelizmente, todos nós (que estudámos ou temos filhos a estudar) conhecemos muitos casos de professores que merecem valentes puxões de orelhas.
Os justos que me perdoem mas os pecadores têm de ser chamados à atenção.
Posso ser eu que tenho mau feitio, mas não me lembro de nenhuma proposta dos professores com vista a melhorar a vida escolar dos alunos. Parece que apenas têm capacidade para olhar para o seu umbigo.
Numa escola do sul de Portugal, uma professora chegava atrasada, sistematicamente, pelo menos meia hora, e tentava sair várias vezes mais cedo. Nunca teve nenhuma falta nem lhe foi descontada qualquer hora. Até ao dia em que esse desconto de horas no ordenado começou a ser feito e na tradicional avaliação (na função pública) deixou de levar a tradicional nota máxima. A sua primeira reacção foi de indignação.
As únicas coisas que os professores veêm como política errada de educação são aquelas que visam ordenar e responsabilizar a sua actividade.
Um novo policial do Padura, com Mario Conde como protagonista e Havana como cenário. De detective, Conde passou a alfarrabista, e na descoberta de uma biblioteca parada no tempo e repleta de preciosidades, encontra num livro de culinária uma fotografia de uma cantora de boleros dos anos 50, Violeta del Rio.
A investigação de quem ela foi e porque a a imagem dela o obceca, vai ser a história deste livro.
É mesmo bom. Padura escreve cada vez melhor . Saboreia-se como um delicioso pitéu, daqueles que ele descreve nos seus livros. Eu só o larguei quando terminei e sinto que é daqueles livros que terei prazer em reler.
Vertigem
Passos descompassados
Dor inerte habitante de mim...
Soltam-me as algemas
Mas prendo as mãos uma na outra...
São as cores cheias de minutos
E as horas escassas de tempo...
Vivo bem na vertigem do que abandono...
Mas corrói-me... esgota-me...
Um passo acertado
E pulo para o cimo do sonho...
Gatos e críticos
"Summario:
Deus fez o homem à sua imagem e semelhança, e fez o crítico à semelhança do gato.
Ao crítico deu ele, como ao gato, a graça ondulosa e o assopro, o rhon-rhon e a garra, a língua espinhosa e a calinerie. Fel-o nervoso e ágil, reflectido e preguiçoso; artista até ao requinte, sarcasta até à tortura, e para os amigos bom rapaz, desconfiado para ps indiferentes, e terrível com agressores e adversários. - Um pouco lambareiro talvez perante as belass coisas, e um quasi nada sceptico perante as coisas consagradas; achando a quasi todos os deuses pés de barro, ventre de giboia a quasi todos os homens, e a quasi todos os tribunais portas travessas - amigo de fazer jongleries com a primeira bolla de papel que alguém lhe atire, ou seja um poema, ou seja um tratado, ou seja um código - Paciente em aguardar, manso e apagado, com um ar de mystério, horas e horas, a sortida de um rato pelos intersticios d´um tapume, e pelando-se, uma vez caçada a preza, por fazer da agonia d´ella uma distracção; ora enrolando-a como um cigarro, entre as patinhas de velludo; ora fingindo que lhe concede a liberdade, e atirando-a ao ar, recebendo-a entre os dentes, roçando-se por ella e moendo-a, té a deixar num picado ou num frangalho"
Fialho de Almeida, Os Gatos
Fotografia de Jean Gaumy: o gato Pataud
26 de fevereiro de 2008
Trivialidades
Estou com umas saudades do meu travesseiro que nem conto. Ou melhor, conto. Um, dois e três.
Sofá!
Janelas e varandas
Mas que representam um mundo estranho é inegável.
Adivinhe-se
Onde é este prédio? Não é no Bairro Chinês, certamente.
Será da família do Catavento do RAA?
Estou farta de passar a pé nesta rua e nunca tinha reparado. Foi preciso que o meu amigo A me chamasse a atenção para o prédio do dragão. E eu registei o reparo.
Cuidado com o reboque!
Eu mandei-o esticar o papel e tirei a foto. Engraçada a complementaridade de mensagens. Para não falar do cordel.
Invasão
Andariamos todos direitos, isso é certo. Também seria como com todas as coisas: haveria pessoas a gostar muito, outras pessoas a gostar pouco.
Talvez trouxessem os amigos alienigenas deles da raça lubrificante. As coisas começariam logo a andar nos eixos e a deslizar melhor.
25 de fevereiro de 2008
Amarelinho
A cabeleireira Manuela
And the winner is
Ressalva feita à surpresa da vitória de Marion Cotillard no papel de Piaf, quando todas as apostas se centravam em Christie, Blanchett ou Page.
Quanto aos looks, definitivamente este era o que vestia :-)
Amy Ryan
o lápis hemostático cutoline
há muitos anos, quando eu era puto, o meu pai, juntamente com a sua navalha de barba, a pedra de afiar (sim!, usava uma pedra do que creio, ser pedra pomes) o pincel embebido em sabão em pó confiança (tentarei encontrar uma embalagem à venda) e uma pedra quase transparente, que humedecia e passava pela cara depois de se escanhoar, tinha sempre um lápis cutoline para a eventualidade da navalha estar demasiado afiada.
a semana passada tropecei numa embalagem completa desta maravilha que ajudou milhões de homens a evitar que que parecessem o mártir são sebastião a escorrer sangue pelo pescoço. não podia deixar de a partilhar convosco.
O Pó dos Livros
A coincidência é que passo por esta livraria duas vezes por dia, de carro ou autocarro e sempre lhe cobiço as montras. Na próxima vez vou parar.
Leiam só esta história que retirei de lá, só para abrir o apetite:
"Pequenas estórias.
Livreiro: Bom dia!
Cliente: Bom dia! Desejava as “Viagens na Minha Terra” do Eça de Queirós.
Livreiro: Perdão! Deve haver um equívoco, esse título não é do Eça...
Cliente: (sem deixar acabar a frase e com uma expressão arrogante) tenho a certeza que é do Eça de Queirós!
Livreiro: Não será a “A Cidade e as Serras” do Eça, (Com a paciência obrigatória de quem está a atender).
Cliente: Não me dê lições! Sou licenciada e sei bem do que falo. Diz-me ou não se tem e, se não tem, onde o posso encontrar?
Livreiro: Pois bem! Esse livro não tenho nem vou ter, "improvavelmente" só na Byblos. Foram eles que prometeram ter tudo…"
Jaime Bulhosa in http://livrariapodoslivros.blogspot.com/
A RTP
24 de fevereiro de 2008
The Tudors: A King's Life
Esta série passaria muito discretamente na RTP há alguns meses, não fosse uma polémica sobre a forma como era apresentado um monarca português.
Gostei aliás de ver a responsável pela exibição da série, explicar muito serenamente a diferença entre ficção e documentário.
E esta é sem dúvida uma boa história, tomando algumas liberdades em relação à realidade ( nomeadamente a morte de Wolsey, de Henri Fitzroy e outras mais). Henrique VIII é uma figura absolutamente fascinante. Estou a revê-la em bloco, maravilhada.
Grandes actores, belas reconstituições, sangue, suor e lágrimas!
Feira do Relógio
Eu acho graça a todas as feiras. Mesmo à do Relógio, que até mudou do sítio que lhe deu o nome.
Resguardada, policiada, asaedada, tudo o que lhe queiram chamar, mas tem uma vitalidade extraordinária.
Difícil é arranjar companhia para ir lá, dada a má fama deste evento.Mas tomando as precauções habituais, não ostentação de metais, relógios, carteiras e afins, é uma verdadeira lufada de ar fresco.
Sim, há umas brigas e umas gritarias, mas isso faz parte da questão. Nunca testei foi fotografar!
Porém estas fotos do Arquivo, documentam-na de forma exemplar.
Hugo e Lulu da próxima vez que forem lá convidam-me?
Fotografias de António Pedro Ferreira, 1999
Manhãs
Montes de passarada a voar espalhafatosamente. Gaivotas. Pombos. Indeterminados. Pessoas nem uma.
Chegada ao trabalho , orgulhosamente só num autocarro conduzido por uma mulher,vejo o gordo melro meu vizinho. É lustroso e canta toda a noite. Eu retribuo-lhe com migalhas. Um comércio justo.
Outro café, sem dúvida. Preciso. Com licença.
Jean Ferrat - Que serais-je sans toi
Acompanha-me desde a adolescência.
Ferrat chante Aragon.
"Qui parle de bonheur a souvent les yeux tristes
N'est-ce pas un sanglot de la déconvenue
Une corde brisée aux doigts du guitariste
Et pourtant je vous dis que le bonheur existe
Ailleurs que dans le rêve ailleurs que dans les nues
Terre terre voici ses rades inconnues"
23 de fevereiro de 2008
Ires e vires
Modernices
Expliquei-lhe o funcionamento da contacto telefónico na pré-história recente das telecomunicações: se alguém queria falar com alguém, ligava para a loja e pedia para avisar a pessoa com quem queria falar que iria ligar outra vez tal dia às tantas horas. O dono da loja mandava recado, de preferência por vários mensageiros, para aumentar a probabilidade de recepção da mensagem. No dia combinado, lá estava o interlocutor telefónico à espera que o telefone tocasse.
Cabia ao dono da loja fazer uma escala de quem atendia quem e a que horas, para evitar ajuntamentos.
Já nem contei que a electricidade só chegou à minha aldeia em 1979 ou 80: isso faz com que eu ainda seja do tempo do candeeiro a petróleo, do petromax e do gerador para ver televisão. Isso sim, um verdadeiro luxo para a época!
22 de fevereiro de 2008
da origem das espécies (vegetais)
espero que não seja premonitória da paisagem futura, nem de uma assombração por antecipação.
para já, merece-se sempre um sorriso a passagem por esta 'fábrica de fogões' que, para além de produzir o que o seu titulo indica, tem este estendal imenso de pequenas maravilhas da latoaria artesanal.
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com aviões a antecipar uma ainda mais tecnológica árvore (àrvore simplex?)
Ontem fui ao médico dos cartões Sete Colinas: do quiosque da Carris, encaminham para a papelaria Tubarão. O que há mais é pessoas com cartões estragadas na fila. Resignada troco o meu por 50 cêntimos.
Diz um senhor da plateia : Ladrões, são o que são. No meu tempo 100$00 dava para comprar um prego, uma imperial, um café e ainda ter troco por cima. E o Metro vai fazer o mesmo! Grandes ladrões!
Ontem passei um dia de trabalho daqueles que apetece esquecer. Nunca me hei-de habituar a ver pessoas a sofrer e comovem-me os pequenos gestos daqueles que fazem tudo para as consolar. Gosto desta palavra, consolo. Esqueci-me de a enunciar no outro dia.
E é isto.
"Ils sont fous ces Romains!"
A última foi: “Tia, tu usaste all star?...” (cara de grande espanto)
“já havia no teu tempo?”
No meu tempo...Como, no meu tempo?!
Como diria o Obélix "Ils sont fous ces Romains!"
21 de fevereiro de 2008
Idas
Fico assim a pensar no que vou fazer, faço o meu melhor sorriso e sento-me. Prendam-me se quiserem.
Quero lá saber. Mas lá fiz a minha viagem. Logo terei que ir ao médico dos cartões de Sete Colinas.
Pensando bem, gostei que me chamassem menina.
20 de fevereiro de 2008
Para a Júlia
carranca redondo, o licor beirão, fajão e a casa do ti capitão
quando era muito puto as viagens para fajão começavam num comboio de queluz para o cacém, onde apanhava a linha do oeste numa viagem de noite inteira até coimbra e novo comboio a atravessar a cidade, até chegar à lousã onde paravamos na pensão carranca à espera da camioneta que subia a serra até à catraia do rolão, onde o zé maria nos ia buscar de carro de aluguer pelos últimos 15 quilómetros de estrada de 'borralho'.
seguramente demorava 24 horas nisto.
não sei se o carranca da pensão era o mesmo que por aqueles tempos percorria a serra (e seguramente o país todo) a vender o seu licor beirão.
carranca é um apelido comum nas terras da lousã.
o que sei é que um dia o senhor carranca redondo foi a fajão e lá deixou um cartaz que durante imensos anos eu vi pendurado no café/posto de telefones/mercearia da terra.
a casa mudou de donos mas sempre lá ficou.
até que a semana passada, perante o meu entusiasmo e admiração por o ver fora da parede, a actual proprietária mo deu, admirada por tão grande satisfação da minha parte.
mas, de facto, saí dali como um puto a quem tinham dado um enorme brinquedo novo.
lavado e recuperada a pintura, ela lá está na que era a casa do ti-capitão ao tempo em que o cartaz chegou a fajão.
e fica lindamente :)