2 de março de 2010

Pelo Campo Grande a ouvir Rita Lee...

Segunda-feira de sol, a convidar à subida do Campo Grande em caminhada, por entre canteiros e arvoredo. Saída do comboio a ouvir Rita Lee, apetecia mesmo esquecer o barulho dos automóveis, a fachada entristecida de alguns prédios em ruínas e percorrer o espaço verde, em tentativa de alheamento da avenida a ganhar cinzentismo e a perder sorrisos...
Como o quarto de hora académico já se tornou instituição, lá caminhei ao ritmo despreocupado, mergulhando no jardim, em busca de um espaço verde que me devolvesse as belas vivências da juventude ou da infância nesta urbana aldeia-natal onde vivi os primeiros anos de vida, muito tendo saltado por entre os canteiros em correrias e risos.
Não pude deixar de pensar na ideia do romance Os Passos Perdidos, ou seja, conseguir experimentar com um significativo intervalo de tempo as mesmas sensações, apreciando da mesma forma espaços do passado transforma-se, na maior parte das vezes, em tarefa estéril. Se por mais nada fosse, a explicação encontrar-se-ia no facto de, na infância, os espaços se afigurarem gigantescos acabando-se, com o tempo, por receber a brusca decepção de limites e de barreiras arquitectónicas. No meio do arvoredo desordenado que ficaria bem numa floresta que sabe cuidar de si própria, a beleza seria decerto evidente... Mas, nos caminhos esburacados cruzei-me com um cego ( perdoem-me não utilizar o eufemismo ‘ invisual’ ), a tactear em indefeso desespero com uma bengala quase inútil, na tentativa de não tropeçar nas crateras do pavimento. A violência da imagem foi como que uma chamada à realidade , tendo decidido de modo repentino desligar, com desencanto, a música despreocupada que me trazia fôlego para uma caminhada a bom ritmo.

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O cartaz camarário a anunciar, desde as últimas autárquicas (já nem lembro quando foram, mas há por aí um post do gin-tonic a referir o assunto) a recuperação da piscina, encontra-se descolado por antiguidade e intempéries.
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Vê-se um dos espaços verdes da cidade vandalizado, com edifícios ao abandono, e vem-me de imediato à memória o nostálgico fado do Campo Grande de Vitorino de Almeida, a par da frase que me não larga até ao regresso a casa: «Lisboa não merece!».

10 comentários:

Gin-tonic disse...

Se os políticos não mentissem como ganhavam eleições?...

Luísa disse...

Quanto aos "invisuais"... acho tão parvo esse atributo. Tanto querem minimizar as coisas, camuflar, esquecer, ignorar, que caem no ridículo.

Quanto ao Campo Grande. Uma dor de alma!!!! No meu primeiro ano de faculdade, eu saía de casa, junto ao metro de Roma, descia oa Av. dos EUA e subia o jardim até à cidade Universitária. Até ao dia em que um colega me pregou um susto com histórias de assaltos e mais não sei o quê. Depois pensei que ele talvez estivesse a exagerar e estava quase a resolver-me a voltar às minhas caminhadas... quando uma colega eo namorado foram assaltados no Jardim do Campo Grande mesmo ao fundo, na zona de Entrecampos!!
A culpa é dos polítiocs porque mentem para ganhar eleições. Mas também é do comum mortal porque acredita. E porque não faz denúncias, não faz exigências, não se queixa, não se agita. Fica na inércia, na passividade e deixa que grafittis encham paredes de espaços públicos, que jardins fiquem desfeitos. E é também culpa daqueles que não preservam rigorosamente nada, que deitam lixo para o chão, que cortam flores nos jardins, com a desculpa que pagam impostos e que os funcionários das câmara estão lá para trabalhar. Esquecendo-se que estão lá para trabalhar para todos e não para serem escravos de alguns...

J A disse...

Creio que uma das fotos é da Piscina do Campo Grande ?
Uma excelente obra de arquitectura que em outras capitais deste continente seria minuciosamente cuidada....
Pérolas a porcos.....

teresa disse...

Infelizmente é uma constatação, Gin, embora ainda haja países - poucos, é certo - onde o cidadão confere credibilidade aos governantes e, por outro lado, estes últimos também sabem que são avaliados de modo atento ao longo da sua 'carreira' mais ou menos auspiciosa, consoante a actuação. Chavões como o de 'politicamente correcto' são perigosos por serem confundidos com o conceito de 'alguém irá decerto resolver os problemas por mim...'.

teresa disse...

Estamos de acordo, Luísa, essa dos 'invisuais' é um outro pequenino exemplo deste chavão do 'politicamente correcto' que dá jeito...
E em matéria de queixas, não sei se isto é próprio de um povo, mas sempre me incomodaram sessões de 'muro das lamentações'. Ainda ontem, em reunião, comentava-se o porquê de haver insucesso nesta ou naquela disciplina com 'o meio é pobre, os pais não têm livros em casa'. No que me diz respeito, preocupei-me em listar algumas soluções (não sei se todas serão viáveis ou se as querem adoptar) em vez de chorar colectivamente. Penso que nos habituámos a fazer isso e depois ainda dizemos que o cidadão x ou o y - publicamente conhecidos - têm por hábito a vitimização...não faremos muitas vezes o mesmo?
No meu tempo de 'Letras', mais do que os assaltos, eram alguns indivíduos com perturbações que se escondiam por detrás do arvoredo entre o hospital e a cantina nova e aborreciam as alunas que passavam. Espero que essa situação tenha terminado. Eu só saía do autocarro de Benfica junto ao hipódromo (para ir para as aulas em 'corta-mato') quando lá encontrava um grupo razoável e, principalmente, se vinha o meu professor de Literatura (pois sempre era um elemento masculino a impor algum receio aos 'transtornados').

teresa disse...

E é mesmo a piscina do Campo Grande, Júlio Amorim. Lamentavelmente, a piscina é uma pequena ponta do iceberg. Todo o jardim e edifícios de maior e menor porte que nele se encontram, estão degradados. Se numa capital é o que se vê, o que dizer do resto do país? Li no boletim do Campo Grande que a piscina é, fora de horas, um local de práticas marginais.

teresa disse...

Ainda acredito na importância dos exemplos:

http://www.youtube.com/watch?v=ZxruR3Q-c7E

Luísa disse...

Além do Campo Grande, uma zona a evitar de dia e de noite, nos últimos tempos que lá estive, era a zona que forma um triângulo entre as traseiras da Fac. de Direito e de Psicologia e o ISCTE. Ouvi falar de assaltos e violações (e não eram doentes do hospital) e também uma nova zona de prostituição (acho que o matagal junto ao Pavilhão Novo[!?!?] também serve para isso). Já não há vergonha!!!

teresa disse...

Luísa,

A falta de vigilância dá força a essas ocorrências e não será por falta de conhecimento das mesmas...

Quanto a passear por zonas ditas perigosas, sou persistente desde que as horas sejam as de maior movimento embora, em tempos, uma amiga tenha sido assaltada junto à livraria da av. dos EUA às 15h da tarde (dava aulas na E.S. D. Leonor e tinha lá ido buscar livros escolares) mas, se pensarmos nisso, também ficamos uma espécie de prisioneiros em saída precária...

Quanto às ocorrências junto ao pavilhão novo, que saudades dos tempos em que estava nas aulas e, subitamente, passavam rebanhos perto do local, mem parecia que se estava em Lisboa.

Luísa disse...

Os únicos animais que por ali vi foram os cavalos da GNR, pois a degradação tomou conta de tudo e as patrulhas eram constantes.

Concordo plenamente consigo. Não podemos ficar em casa só porque há assaltos e outras coisas más, mas saber que uma zona onde supostamente devia haver calma, "instrução aos molhos" (escola secundária, faculdades e Torre do Tombo!!!) foi largada aos bichos... desanima um bocado!