11 de setembro de 2009
ONZES DE SETEMBRO
A 11 de Setembro de 2001, um criminoso atentado terrorista, contra as duas torres
do World Trade Center, em Nova Iorque, matava cerca de três mil cidadãos de diversas nacionalidades, dando origem a uma escalada de violência que culminou com o eclodir da Guerra do Iraque, ponto de partida para um radical agravamento da situação internacional.
Também a 11 de Setembro, mas de 1973, um odioso golpe militar dirigido pelo
General Augusto Pinochet (preparado e apoiado pela Administração
norte-americana) derruba o governo legitimo, constitucional e democraticamente eleito
do Presidente Salvador Allende, provocando vários milhares de assassinatos, 30 mil são os números calculados, prisões, o exílio de duzentos mil chilenos e uma feroz ditadura que durou 17 anos.
Para assinalar o 1º aniversário do atentado de Nova Iorque, o produtor francês Alain Brigand, pediu a 11 realizadores, de vários países, para fazerem uma curta-metragem de 11 minutos, nove segundos e um frame sobre os acontecimentos.
O resultado é um filme, necessariamente, polémico, mas muito interessante.
De todas as curtas-metragens, a do inglês Ken Roach será a mais contundente. Ao colocar Pablo, um exilado chileno, a escrever e a ler uma carta de solidariedade ao povo norte-americano, o cineasta acaba por colocar o dedo na ferida, ao lembrar que não foram apenas os norte-americanos a terem um onze de Setembro.
Esta é a carta que Pablo escreve e lê, enquanto vão passando imagens da eleição e do assassínio de Salvador Allende:
“Queridos mães, pais e amados daqueles que morreram no dia 11 de Setembro em Nova Iorque:
Sou chileno e vivo em Londres. Quero dizer-vos que talvez tenhamos algo em comum. Os vossos entes queridos foram assassinados como os meus e na mesma data: 11 de Setembro. Terça-feira.
Em 1970 houve eleições. Eu tinha 18 anos e votei pela primeira vez. Tínhamos um sonho lindo, o de construir uma sociedade em que o nosso povo partilhasse os frutos do seu trabalho, a riqueza do país. Por isso em Setembro de 1970 todos votámos e vencemos. Havia leite e educação para as crianças. Terras por cultivar foram dadas a trabalhadores sem terra. As minas de carvão e de cobre e as principais indústrias tornaram-se pertença de todos nós. Pela primeira vez na sua vida as pessoas tinham dignidade. Mas ignorávamos como tal era perigoso. O vosso Secretário de Estado, Henry Kissinge,r anunciou: “Não sei porque havemos de ficar a ver um país tornar-se comunista devido à irresponsabilidade do seu povo.”
A nossa decisão democrática e os nossos votos eram irrelevantes. O mercado e os lucros são mais importantes. A partir desse momento a nossa dor e a vossa dor foi legalizada. O vosso Presidente Nixon disse que poria a nossa economia a gritar. Ele mandou a CIA tomar parte activa num levantamento militar, um golpe de estado. Dez milhões de dólares e mais, se necessário, foram disponibilizados para derrubar o nosso Presidente Salvador Allende.
Amigos, os vossos lideres pretenderam destruir-nos. Desencadearam uma guerra no sector dos transportes que quase paralisava a nossa economia. Eles pararam todo o comércio entre nós o que provocou o caos. Estavam feitos com os chilenos que não aceitavam a nossa vitória. Os vossos dólares apoiaram neo-fascistas que geraram violência nas ruas e puseram bombas em fábricas e centrais eléctricas. Por estranho que pareça, não surtiu efeito. Nas eleições municipais o nosso apoio aumentou. E o que fizeram os Estados Unidos da América?
Aqui Pablo interrompe a leitura da carta. Surgem imagens de George W. Bush no seu discurso após o 11 de Setembro
“No dia 11 de Setembro inimigos da liberdade cometeram um acto de guerra contra o nosso pais e a noite pôs-se sobre um mundo diferente, um mundo onde a própria liberdade é atacada.”
Pablo regressa à leitura da carta Surgem imagens dos ataques ao palácio presidencial:
“No dia 11 de Setembro inimigos da liberdade cometeram um acto de guerra contra o nosso país. Ao raiar da aurora tropas e tanques avançaram sobre o nosso palácio presidencial. Allende e os seus ministros e conselheiros estavam lá dentro. Allende não fugiu quando o Palácio Moneda foi atingido.
Ele foi assassinado. Assassinaram-no. Numa terça-feira. A nossa terça-feira. Dia 11 de Setembro de 1973. Um dia que destruiu a nossa vida para sempre.
Deram-me um tiro no joelho e fizeram encostar-me a cara ao pó da estrada. Bateram-me tanto que por várias vezes perdi os sentidos. Um dia na prisão cheguei-me à grade e vi o German Castro a ser arrastado pelos braços. Ele não conseguia andar, sangrava dos ouvidos. Eles partiram-lhe os ossos e depois assassinaram-no. Soubemos dos campos de tortura dirigidos por oficiais treinados nas escolas americanas. Soubemos que havia gente estripada atiradas de helicópteros, torturada em frente aos filhos e cônjuges. Sabem o que eles faziam? Punham-lhes electricidade nos órgãos genitais. Punham ratazanas nas vaginas das mulheres e treinavam cães para as violar. E depois soubemos da “Caravana da Morte” do general que ia de terra em terra a fazer execuções aleatórias. 30 mil pessoas foram assassinadas. 30 mil. O vosso embaixador no Chile queixou-se das torturas e Kissinger disse: “Ele que pare com os discursos de ciência política”.
O general Pinochet, organizador do golpe sorriu e aceitou os parabéns do Secretário de Estado. E os dólares recomeçaram a entrar no Chile. Chamaram-me terrorista e condenaram-me a prisão perpétua sem direito a julgamento ou defesa. Fui libertado cinco anos depois mas tive de deixar o país para não pôr em perigo os meus amigos. Não posso regressar ao Chile embora não pense noutra coisa. O Chile é a minha pátria mas o que seria dos meus filhos? Eles nasceram em Londres. Não os posso condenar ao exílio como eu. Não posso fazê-lo agora mas anseio por voltar.
Santo Agostinho disse: “A esperança tem duas belas filhas – a Raiva e a Coragem. Raiva pelo estado das coisas. Coragem para as mudar.”
Mães, pais, amados dos que morreram em Nova Iorque:
Em breve será o 29º aniversário da nossa terça-feira, dia 11 de Setembro, e o 1º aniversário da vossa. Nós recordar-vos-emos. Espero que vocês se recordem de nós.
Pablo”
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3 comentários:
11- 9- 1973
20- 12- 1973?
25- 4- 1974?
raúl rego, josé antonio novais tomé, mariano robles romero- robledo.....
De regresso a casa, ouvi várias vezes a uma colega: imagino o destaque dado ao evento de há 8 anos e, provavelmente, nem uma referência a Allende (não sei se assim foi, sem tempo para leitura de jornais).
Obrigada:)
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