11 de julho de 2008

Quando um prédio chora



Um prédio chora quando cai. Contaram-mo.Depois, aprendi a ouvi-los. Uma toada melancólica e arrepiante composta do som das madeiras a ceder e do persistente fluxo das caliças. Este som é-me familiar, e atempadamente,os olhos e o nariz pressentem que algo está mal e acusam-no fisicamente. Por vezes este lacrimejar é útil. Disfarça o que a mais se possa sentir.
Ainda a tarefa dolorosa de preparar as pessoas para o inevitável. Geralmente idosos, integrados no bairro e no prédio há muitos anos. Como se prepara? Tenho sempre a consciência que tudo é nada, para suavizar esta dor e desenraizamento.
Nunca me esqueço duma escalada que fiz na zona da Penha de França, para um senhor me mostrar um belo terraço com vista para o Tejo. E , enquanto eu olhava para baixo e pensava se não iria dar uma queda monumental, dizia-me ele a casa é um porcaria mas e esta vista minha senhora? Quem diz que os pobres não precisam de beleza para viver, engana-se profundamente.
Também passei por este prédio, um gaioleiro nas Avenidas Novas. Esta sala suspensa, com tudo pronto à espera da próxima refeição. Aí pica a memória de infância, retirar o centro, o naperon e colocar a toalha. Estas imagens habitam os meus sonhos. às vezes outras bem piores.
Mas quem não sonha não é gente, e quem não sente a dor dos outros também nunca será sentido.

A pedido do Carlos que achou o outro texto lacónico demais.

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