Há uns meses vi na RTP2 um documentário sobre, creio, epilepsia. Tratava-se de um caso concreto. Admito que não tenha percebido bem e de forma rigorosa tudo acerca desse caso. Era mais ou menos isto: uma criança com capacidades intelectuais normais sofre de epilepsia. De cada vez que tem ataques de epilepsia, ataques muito severos, há o risco dessa criança morrer. Ainda por cima, esses ataques são frequentes. Existe uma operação ao cérebro, creio que consiste em cortar algumas ligações que existem entre os dois hemisférios cerebrais, que faz com que a criança não volte a ter ataques epiléticos. Esta operação faz com que a criança fique com uma grave diminuição das suas capacidades intelectuais: o seu raciocínio fica enfraquecido e fica também mais lento. O dilema parece ser este: manter uma situação que comporta o risco de vida e o risco de sofrer lesões cerebrais que podem causar uma diminuição gigantesca ou grave das capacidades intelectuais e/ou motoras e/ou de comunicação ou então optar por uma cirurgia que com uma probabilidade elevadíssima elimina o risco de vida e aqueles outros riscos mas que implica necessariamente uma diminuição intelectual pronunciada.
Pesando e comparando as duas opções, parece que faz sentido, é “economicamente racional” optar pela cirurgia. De qualquer forma, saber que foi essa a escolha dos pais deixou-me chocado. Senti-me chocado, muito mesmo, ao ver aquele programa de televisão. Não estou a dizer que os pais escolheram mal nem, por agora, estou interessado na questão de quem teria legitimidade moral para escolher. Estou apenas a dizer que me senti mesmo muito chocado ao ver esse programa de televisão em que se mostrava uma situação em que a possível melhor hipótese envolvia a estupidificação de uma pessoa. Aqueles pais quase que podiam ter-se despedido do seu filho: antes da operação era inteligente, era um, era aquela criança. Depois da operação (desculpem a linguagem forte!) era estúpido, era uma outra criança, uma nova pessoa, que comparada com a primeira era diminuída. E ainda que seja para mim muita estranha, acho que talvez defenda a opinião de que teria sido preferível a criança nem se aperceber do dilema. Que horror seria para ela saber que antes da operação ainda era inteligente, ainda era ela mesma e que depois da operação talvez fosse outra e seria, de certeza, diminuída intelectualmente.
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