8 de outubro de 2012

Factos e não argumentos...

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De regresso a casa e após o dia de trabalho, dirijo-me à porta automática que permite sair da estação ferroviária. Vejo o habitual amontoado de gente – desde o ano passado que os comboios voltaram a ser mais utilizados por motivos do domínio público. Reparo numa senhora de meia idade que, dirigindo a palavra a um jovem de ar "rebelde sem causa" (ela percebeu que ele viajava sem título de transporte), o convida a passar quando coloca o seu passe no leitor de acesso à saída. O rapaz passa numa correria, mais um viajante a custo zero. Após uma semana, para muitos, impeditiva de deslocação dentro das horas de expediente por não existirem alternativas, saliente-se pretender o texto ater-se a factos e não a argumentos: gosta-se pessoalmente de tal exercício, por ser o mesmo praticado quando, em sala de aula, se trabalha o que é (ou deveria ser) o género jornalístico conhecido por notícia (por oposição a texto de opinião, um relato meramente factual, não adjetivado). As estações desertificam-se de funcionários, em tempos deste “admirável mundo novo” onde para tudo há máquinas: para compra de bilhetes, o que desespera as gerações mais antigas; para passar o controlo automático de entrada/saída (o que decerto também reduzirá o número de revisores); para trazer alguma insegurança a quem trabalha ao sábado, até ao fim da tarde, nos dias curtos de inverno (com as estações desertificadas, a convidar a presenças indesejáveis e alguns episódios de ação incorporados). Não se pretende, aqui, opinar sobre as greves de transportes, o gesto “amável” de uma passageira, pretende ser mera constatação a dar força à ideia de hospitalidade (?)… que – diz-se - tanto caracteriza os portugueses. Factos e não argumentos para quem, não se considera adepta de programas que no título publicitam o direito ao contraditório e pretendem veicular uma opinião única … Fica-se a pensar se, tal “generosidade” de alguns passageiros, não será também ela um gesto de rebelião doméstica, observada pelo seguinte ângulo “paguei o passe que tanto tem aumentado e fiquei uma semana sem o poder utilizar”… Como conclusão há dias, uma passageira que aufere pouco mais do que o ordenado mínimo, foi empurrada por mais um clandestino que lhe pediu desculpa. Incomodada, a minha amiga respondeu «não desculpo».

9 comentários:

Eduardo disse...

A justificação é simples: a criação de encargos sociais sobre os salários e o salário mínimo tornaram a utilização de máquinas mais barata, como se explica aqui de forma mais precisa:
http://www.youtube.com/watch?v=I_IMuxMXd3E

teresa disse...

Não duvidamos que o que preside a tal decisão (máquinas e não pessoas) é a questão financeira,mesmo com alguns passageiros (diria que cada vez mais) a viajarem sem título. A automatização não resolve problemas como os das bilheteiras automáticas que, por vezes, avariam, sem que estejam por perto técnicos que resolvam o problema (o que é extensivo a máquinas em parques de estacionamento) e - reiterando a ideia - desertificam espaços, reforçando a insegurança.

Donatien disse...

O Metro em Londres pode circular sem condutor...logo o de Lisboa também...Só por razões que desconhecemos é que não despedem os condutores.

teresa disse...

... "admirável mundo novo" :o(

Luísa disse...

O que eu mais odiei no dia em vi esta palhaçada de portas automáticas foi o facto de se perder o encanto de se esperar uma pessoa no cais. Há algo melhor do que saltar do comboio e ter alguém à nossa espera, que nos abraça logo a seguir?!?

Depois concordo plenamente com seu o reparo ao facto de a insegurança e desertificação serem cada vez maiores.

Por fim, aqui na Suíça paga-se tudo e mais alguma coisa, eles são poupadinhos e usam tecnologia de ponta para tudo e mais alguma coisa. Mas... bilheteiras com seres humanos, picas, seguranças... circulam todo o dia nas linhas de comboio, nas carreias de autocarro e eléctrico. Dando passadelas nocturnas pelos parques de estacionamento pertencentes à companhia de caminhos de ferro.
Moro em frente a uma estação de comboio onde só passam 3 comboios para cada lado por hora e de seguna a sexta há um funcionário das 7h até às 18h com uma pausa para almoço.

Em Portugal não sabem é fazer contas. Deviam baixar salários dos grandes para manter os postos de trabalho dos pequenos. Os pequenos não iam para o desemprego ganhar uma miséria e pagavam impostos. Que mais à frente iriam reverter a favor do resto da população. E talvez um dia se aproximassem dos helvéticos que são os campeões do mundo de utilização o comboio (média 2310km por pessoa, são 7milhões de habitantes...). Mas isto sou só eu a dizer...

teresa disse...

... a dizer e bem, Luísa, até porque não se trata - e isso por si só seria suficiente - de uma questão de atirar pessoas para o desemprego. É que elas faziam lá falta e nada as substitui, desespera ver algumas pessoas mais velhas de ar perdido, por não saberem utilizar a máquina para compra de bilhetes, ante a impaciência dos que querem apanhar o comboio...

Luísa disse...

Exactamente! E nem é preciso serem pessoas mais velhas. Eu acho o sistema de aquisição de bilhetes do metro uma confusão enorme (não sei como funciona com outros meios de transporte, pois eu já me rendi ao táxi quando estou de férias!) . São não sei quantos tipos de bilhetes que se podem adquirir, mas temos que escolher não sei quantos caminhos até finalmente atingirmos o que queremos.
Quando morava em Lx, usava passe e os bilhetes eram coisa rara. Depois que vim morar para aqui o software das máquinas mudou para pior. Então acabo sempre por fazer asneiras ou demorar um tempão até conseguir o que quero.
Mas depois há aqueles dias em que as máquinas estão fora de serviço e os belos das cabines estão desertas... :s

Há o país que "não é para velhos", mas Portugal, infelizmente, está a tornar-se num país que simplesmente não é para pessoas!!!

teresa disse...

Pois... este assunto das máquinas dava um 'rimance' , Luísa, desde ver pessoas a conversar com estes artefactos tecnológicos (versão moderna de Vasco Santana a falar com o candeeiro), até - uma outra versão das avarias - ficar "presa" na estação, mesmo com bilhete válido, quando as portas encravam... modernices, é o que é, a minha avó é que tinha razão, quando dizia «no meu tempo, só havia a manteiga e a banha, agora é só invenções» :o)

Luísa disse...

Essa da banha lembrou-me um sobre comida e modernices que também daria para fazer um tratado.
Eu tenho a impressão que os portugueses viveram tanto tempo atarracados, presos na ditadura e na mentalidade fechada do regime que quando se viram soltos quiseram apanhar os que estavam à frente e acabram por atropelar etapas do processo evolutivo da sociedade. Pensam que podem passar de criança para adulto sem se ser adolescente. Quando certas pessoas mal sabem atender um telefone ou ligar a televisão, como é que pode ser tudo frio como uma máquina E depois o resultado é o que é...