18 de fevereiro de 2010

PESCADOR DE PÉROLAS







Durante cerca de 10 anos, Mário Castrim, como crítico de televisão do “Diário de Lisboa”, fintou a censura. Umas vezes o drible saia-lhe bem, outras vezes não.
Havia que saber ler nas entrelinhas.
Um dia, ordens superiores, colocaram o “Canal da Crítica” fora de jogo.
A populaça ergueu-se em enorme escarcéu. O ditador de S. Bento entendeu que era pior a emenda que o soneto e mandou que colocassem, de novo. o Mário Castrim em jogo.
No dia em que isso aconteceu, Castrim escreveu um pequeno texto. Aquilo a que ele chama pérolas.

“Regresso. Comovido, como quem regressa ao país da sua infância. Ficou para trás a calma, o sono reencontrado, o silêncio por toda a casa. Ficou para trás a visita de amigos, a frescura da noite, o deambular descuidado. Ficou para trás o ser “como toda a gente”. E no entanto, este regresso, na sua felicidade perdida, tem o sabor de uma felicidade reencontrada. Vou de porta em porta apertando as mãos que se estendem, forte de uma grande família. Vou crucificar os olhos no fulgor violento do televisor. Vou, pelo túnel da noite, em perseguição das palavras úteis, ou necessárias, ou simplesmente possíveis. Difíceis sempre, arrancadas da carne a grande profundidade da pele. Palavras que seriam de amizade, a selar a presença vivida, revivida, de tantos rostos desconhecidos e atentos. Palavras de quem, regressando ao frio da noite, regressa também, a morosamente, ao país da sua infância, ao país do seu país.”

1 comentário:

almariada disse...

Sim, pérolas! :) Obrigada!