15 de setembro de 2009
Lembrando o aniversário do poeta Bocage
Sabendo que “o poeta é um fingidor” tal como um dia Pessoa escreveu, é interessante esta dualidade(hoje alguns chamar-lhe-iam bipolaridade) em Bocage. Tendo ouvido quase diariamente, nos tempos de estudante de Literatura que “nem pensar em fazer leituras biográficas em prosa ou poesia”, é curioso verificar tamanha diversidade temática no autor e, mais ainda, fugindo às instruções do passado, lembrar que os temas (desde a poesia satírica aos sonetos de amor e ataque desabrido à religião vigente para acabar num arrependimento dos últimos tempos de vida lembrando os momentos desbaratados) trazem a tentação de associar a par e passo a vida e a obra de Elmano Sadino.
Desde os poemas satíricos – e aqui a sátira é desabrida e brejeira, mesmo para os nossos dias – aos sonetos cujo cenário de eleição, já a anteceder os Românticos é o ‘locus horrendus’ povoado de ciprestes (a árvore dos cemitérios), a tempestade, a noite, os mochos a piar assustadoramente, a fim de revelar o sujeito poético um estado de espírito que pretende tornar quase acolhedora a paisagem, tentando mostrar serem os seus sentimentos mais tristes e aterradores do que os locais desenhados, a escolha para lembrança do dia do aniversário de Bocage acabou por recair num texto que não se inscreve nem na sátira nem nos sentimentos de profunda tristeza, a inspirar quase horror em quem o lê. O tema de ser o poeta alguém não entendido pelos restantes humanos ou, em instância alargada, a de todo o artista se sentir forçosamente diferente, com a inevitável atracção que exerce em quem se situa do lado de cá (o do não escritor, compositor, músico, pintor, etc.) levou à escolha deste louvor (comparado) a Camões:
Camões, grande Camões, quão semelhante
Acho teu fado ao meu, quando os cotejo!
Igual causa nos fez, perdendo o Tejo,
Arrostar co'o sacrílego gigante;
Como tu, junto ao Ganges sussurrante,
Da penúria cruel no horror me vejo;
Como tu, gostos vãos, que em vão desejo,
Também carpindo estou, saudoso amante.
Ludíbrio, como tu, da Sorte dura
Meu fim demando ao Céu, pela certeza
De que só terei paz na sepultura.
Modelo meu tu és, mas... oh, tristeza!...
Se te imito nos transes da Ventura,
Não te imito nos dons da Natureza.
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