9 de setembro de 2009

Back to school : take 3

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A Tatiana está sempre a dizer que o Ruca é parvo, e que só mesmo outra parva como a Matilde para engraçar com um fulano cheio de borbulhas, cabelo a escorrer óleo, a mascar pastilha elástica vinte e quatro horas por dia, e com o vocabulário reduzido a «fogo!» e «tás a ver». «E isto, claro» acrescenta sempre Tatiana, «só nos dias de grande inspiração».
Dor de cotovelo, é o que é.
O Ruca é igualzinho a um artista de cinema. […]
- Um artista de cinema? Claro! Entre ele e o Leonardo Di Caprio não há mesmo diferença nenhuma!
Matilde amuou:
- O Leonardo Di Caprio é muito gordo. Não sei o que tu vês nele.
Ao princípio, o Ruca não tinha gostado da ideia.
- Um baile? Fogo! Vocês devem ter todos batido com a cabeça nalgum sítio! Tás-me a ver a mim, todo fatela, a ficar ali com uma chavala, nem atrasa nem avança, fogo! , com aquelas músicas muito foleiras e aquela cambada de cromos a olhar para a gente, fogo! , vocês passaram-se, meus, passaram-se!
Tatiana mirava-o de alto a baixo, com um ar de olha-se-o- Leonardo-Di-Caprio-alguma-vez-falaria-assim, mas ele não percebeu.
Segundo Tatiana, o Ruca levava sempre o dobro do tempo que uma pessoal normal levaria a entender uma simples frase, sujeito, predicado, complemento directo.
Matilde ficava muito ofendida quando a ouvia.
- Tu é que não percebes nada de nada – dizia.
- O Ruca pensa sempre muito bem antes de responder às perguntas. É só isso. E isso era o que muito boa gente devia fazer também.
- Um baile…- resmungou novamente o Ruca. – Fogo!
Acabou por encolher os ombros e enfiou duas pastilhas elásticas para dentro da boca. Voltou a resmungar qualquer coisa entredentes, e desapareceu rua abaixo. […]
A directora de turma é que viera com essa história.
- Um baile? – exclamara um coro de vozes, subitamente acordadas.
- Um baile – repetiu ela. – Mas um baile a preceito.
- O que é um baile a preceito, setôra? – perguntou o Fábio.
- Um baile como deve ser – esclareceu ela. – Com valsas, com boleros, com slows
- Fogo! A cota passou-se! – bichanou o Ruca para a Matilde. […]
- Mas- acrescentou a professora – não quero cá dessas músicas malucas que vocês costumam ouvir. Para isso, vão lá para a Vinte e Quatro de Julho […] Vamos fazer um baile a preceito, como deve ser, com os rapazes a irem buscar as raparigas («buscar as chavalas para quê?», perguntou intrigado o Ruca, antes de levar com outra cotovelada da Matilde), e evidentemente os vossos pais seriam também convidados («Os cotas, minha? Fogo! Berrou espantado o Ruca, levando nessa altura uma canelada da Tatiana), uma coisa mesmo a sério.
A setôra estava muito feliz com a ideia.

Alice Vieira, «Valsa a Três Tempos», Trisavó de Pistola à Cinta

5 comentários:

Paula disse...

Alice Vieira: uma das minhas escritoras preferidas!
:)

teresa disse...

E este 'quadro' é mesmo muito realista - a senhora conhece bem o ambiente teen:D

sábado à noite disse...

Olá,
é sempre bom encontrarmo-nos onde menos esperamos...
Beijinhos para todos!

ALICE VIEIRA

sábado à noite disse...

Olá,
é sempre bom encontrarmo-nos onde menos esperamos...
Beijinhos para todos!

ALICE VIEIRA

teresa disse...

Obrigada, Alice.
Retribuição de beijinhos.:)