8 de agosto de 2009
Raul Solnado: um homem que marcou gerações
Surpreendida há minutos com a notícia sobre a partida de Raul Solnado e sendo este espaço (também) de memórias, subitamente viajei até à infância, lembrando momentos bem humorados em que, durante serões familiares, se ouvia o disco sobre a guerra "estava eu à porta da guerra" - e lá chegava a frase com a entoação que só o humorista lhe sabia dar. Mais tarde, já em idade de reflectir criticamente, pensei que se pode brincar com coisas sérias, mostrando o absurdo de alguns acontecimentos.
Já no início da adolescência, evoco o brilhante desempenho de Solnado no Zip zip: destaco com nitidez o baladeiro, boneco bem conseguido em que se fazia humor com algumas das rimas das baladas: sabemos que na época fazer música de intervenção era uma coisa séria e nem todos o conseguiriam, lembrei ainda um outro boneco, o alemão Fritz, com um brilhante sotaque, que em puro nonsense afirmava ter inventado as 'batatas fritz' de pacote.
Ainda não há muito - périplo habitual - acompanhei os meus jovens alunos ao Maria Matos para assistirem ao vicentino Auto da Barca do Inferno , tendo ficado sensibilizada quando, no final, a atenção se deslocou do palco para a plateia: sem que ninguém lhes dissesse os jovens, ao aperceberem-se de que Raul Solnado se encontrava entre os espectadores, aplaudiram-no de pé, o que me fez de imediato pensar que se tratava de um humorista a atravessar e a marcar as diferentes gerações.
Ficará para sempre na memória colectiva, disso não subsistem dúvidas.
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13 comentários:
Acho que a Teresa disse tudo(...)
Apesar de ele estar cada vez pior e outra coisa não ser de esperar, o seu passamento custa, na medida em que com a partida destas pessoas, vamos ficando cada vez mais pobres.
Um dos homens do ZIP ZIP!
As pessoas dignas do Zip Zip, Fialho Gouveia e o Solnado, já não estão entre nós... falta um nome, mas a esse, retiro-lhe o valor que teve, pelo 'mal que sabe'... até a Justiça fazer bem as 'contas'...
O pai do Raúl tinha uma fabriqueta de vassouras ao fundo da Av. D.Carlos I.
Ele ajudou o pai no trabalho! e aprendeu bem!... pelo
menos, a dar 'vassouradas' com humor 'sui generis' na Sociedade e nos seus 'defeitos'(...)
... e não referi a 'grande escola' que foi a Sociedade Guilherme Cossoul, por pensar que as pessoas significam para nós essencialmente a forma como marcaram a nossa vivência ou como se cruzaram no nosso caminho individual. E ele no Maria Matos com ar acanhado com os olhos a sorrir, a agradecer de forma discreta mas feliz o reconhecimento da juventude que o aplaudia espontaneamente e com entusiasmo:)
É verdade! ele tinha 'acanhamento'
de ter êxito!
Às vezes, parecia que tinha de pedir desculpa por ter feito bem um trabalho!...
Que tenha Paz profunda!
Infelizmente a Teresa não disse tudo.
Se Solnado foi o maior humorista português da segunda metade do Século XX, esqueceu-se que foi um dos maiores actores dramáticos Portugueses.
Naturalmente que não esqueceremos a Guerra de 1908, que nem sequer é uma criação sua - é uma rábula de origem espanhola. Mas eu nunca esquecerei a sua maior intrepretação como João BArbelas em Dom Roberto.
Na hora de se fazer a síntese de uma vida intensa, escapa muita coisa importante!
É claro que Raul foi famoso com outros 'episódios' de maior valia do que aquela 'heroicidade' de ir para a guerra, encher a guerra de moscas...
Parece que a "Casa do Artista" teve a sua assinatura!... por onde andariam as pessoas do n/maltratado
'mundo artístico' sem aquela Obra Social?!
No geral, apuramos na hora do choque da partida apenas o acessório! Na especialidade,... a 'especialidade' era ele, porque foi uma Figura Pública muito Especial!
Nem eu teria alguma vez (nunca tenho) a pretensão de dizer tudo, Luís Bonifácio. Agradeço a referência à prestação do actor em registos não humorísticos embora muitos afirmem, não sei se com legitimidade, que por vezes ser-se humorista é ainda mais difícil (embora os chamados 'canastrões' façam má figura em tragédias ou desempenhos mais 'pesados'). Quanto ao facto de não ser a rábula um texto nacional, aspecto que conhecia, tal não lhe retira o mérito do cunho pessoal, como o Luís tão bem refere pois, caso assim fosse, só na Alemanha teriam legitimidade as representações de Brecht ou no Brasil as de Augusto Boal, para não ser geográfica e temporalmente exaustiva. Tenho noção de me ter limitado com modéstia a simples apontamentos pessoais.
Fiquei curiosa sobre outro tipo de prestações do actor, embora me pareça que, para a generalidade dos cidadãos, virá sempre a ser alguém indissociável do humor (do mesmo modo que a excelente Maria do Céu Guerra, tendo feito comédia nos primórdios, será associada pelos apreciadores de teatro a outra tipologia de textos dramáticos).
um abonita e merecida homenagem.
Obrigada, IsaMar.
Acabei de ouvir o depoimento da ex-mulher do actor e fiquei sensibilizada quando afirmou que, pelo seu temperamento discreto, Solnado teria certamente apreciado que tudo tivesse sucedido sem ajuntamentos e foi o que sucedeu: a data de calendário é mais propícia a evitar grandes homenagens (o que vem ao encontro da impressão que me causou não há muito tempo no Maria Matos).
Com o seu humor ajudou-nos a passar os cinzentos dias de uma ditadura.Também essa lufada de ar fresco televisivo que se chamou “Zip-Zip”. Esse tão esquecido “Dom Roberto de José Ernesto de Sousa, filme fundamental do nosso cinema, os primeiros passos de uma extraordinária Glicinia Quartin. A televisão destruiu o registo do Schweik” que representou no “Maria Matos” com encenação de Artur Ramos. É possível? É mesmo! Mas deixaram incólumes aqueles jogos de futebol que passam na “RTP Memória” – o que eles querem é futebol!
Para onde quer que tenha ido, que faça o favor de ser feliz. Por aqui, continuamos a tentar… mas agora sem o seu humor...
Incomoda saber que arquivos tão significativos da rtp tenham desaparecido, não se circunscrevendo, infelizmente, a ocorrência ao referido no comentário do gin.
Tendo hoje percorrido as páginas do Público, foi-me grato lembrar igualmente outro programa da responsabilidade de Solnado num tempo ainda bastante marcado pelo cinzentismo: refiro-me à Visita da Cornélia onde tivemos o prazer de conhecer melhor figuras de que nos orgulhamos, refiro-me a nomes como José Fanha ( que mais tarde encontrei como orientador de estágios de artes na minha saudosa escola secundária de Mafra, hoje escola José Saramago),Vasco Raimundo (um vizinho no Algueirão) e um Fernando Assis Pacheco revelado numa faceta bem-humorada e intimista, mais próxima de todos nós, cidadãos comuns (correndo aqui o risco de não mencionar outras 'revelações' igualmente importantes).
Um artista maior.
http://pt.wikipedia.org/wiki/A_Visita_da_Corn%C3%A9lia
Encontrei alguma informação na net e deu para melhorar o texto sobre o programa. Já que a RTP não arranja alguma forma de recordar alguns desses momentos. Mesmo com depoimentos dos protagonistas e dos espectadores.
O Zip-zip faz anos em 2009.
O Zip-zip merecia ser lembrado. Grata pela indicação:)
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