6 de maio de 2009

NA ROTA DE VELHOS ANÚNCIOS

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Lisboa anos 70.
Algures desenhava-se um qualquer Abril.
Livraria “Opinião”.
Um porta-aviões dentro da cidade,
Onde se chegava para que, no cinzento da cidade reprimida, acontecesse um brilhozinho nos olhos aos filhos da madrugada, o teu nome que não escrevo sobre esta página, eles não nos deixam cantar Robeson, vieram cedo mortos de cansaço as palavras interditas, que cantam os poetas, não há só gaivotas em terra quando um homem se põe a pensar, notícias do meu país, um lírio e um canivete, queixa das jovens almas censuradas, perfilados de medo.
Livraria “Opinião”.
Inúmeras dificuldades, burocracia vária, licenças disto e daquilo, tentativas para que não houvesse Opinião. São essas dificuldades de que o anúncio, publicado no “República” de 26 de Novembro de 1971 fala. Estava o Natal desse ano a bater à porta quando a “Opinião” abriu portas.
Livros, discos, conversa, muita conversa. Ah! Podia-se fumar. Conspirava-se. Num sábado à tarde, no chão, encostados a uma parede, uma série de LPs em 2ª mão. Comprou “The Byrds” a cantarem Bob Dylan. O Fernando Assis Pacheco numa sessão de autógrafos. Uma garrafa de tinto “Cantanhede”, morcela assada, escadinhas do duque.
Uma catadupa de imagens, memórias, vindas aqui, porque o Carlos se lembrou que chegou a ouvir o Pedro Oom na “Opinião”
Onde o porta-aviões um dia atracou, está agora a livraria da editorial Cotovia. Um pouco mais abaixo, mas do mesmo lado da rua, a Cervejaria Trindade. Mais histórias para contar…

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4 comentários:

carlos disse...

não era apenas o oom.
eram as boas vindas do madeira luís ou do hopólito clemente ou de mais umas jovens senhoras absolutamente solícitas para encomenendar, guardar e deixar levar para o bar do último andar sem ter que pagar a leitura...
a opinião era uma ilha na cidade.
literalmente

carlos disse...

a propósito do hipólito clemente, lembrei-me do poema dele que o janita musicou e cantou de forma brilhante:

sentado a fumar
o corpo avaro e quente
no rebanho das nuvens claras
olhava a janela em frente
na tarde de casablanca

varandas de cal e gesso
mulheres a espreitar furtivas
os homens e o futuro
paredes de branco e ocre
onde o sol se esquece
em casablanca

tantas coisas já vi em casablanca
já vi o rei
já vi um incêndio na rua reitzer
já vi polícias
já vi desfiles
vi uma velha com duas caras
vi fazer kif
já comi laranjas
nos campos de kzar-el-kbir

mas de tudo o que vi
e mais grato guardei
no peito cá dentro
foi o sorriso da moura
que habita a janela em frente

teresa disse...

Obrigada pelo reavivar de memórias, também frequentei a livraria (para mim era mais do que um simples local onde se pode comprar, pois muitas vezes não comprava) nos tempos de faculdade com colegas e amigos, era um espaço diferente e acolhedor:)

gin-tonic disse...

Sim, Carlos, o Hipólito era a alma e o coração da "Opinião". Desconhecia o poema e a canção do Janita Salomé.
A abertura da "Opinião" foi mirabolante. Para além das autoridades com todos os entraves e mais um, o decorador, ou alguém, enganou-se na medida das estantes e as mesmas não cabiam na livraria. Houve que fazer outras e puseram as que não cabiam à venda.
Uma está por aqui, excelnte madeira, não há um desnivel das prateleiras face ao peso dos livros. Já não há disto. Custou 1.00$00.
Um abraço