18 de fevereiro de 2009

UM FILME DE QUANDO EM VEZ

Image Hosted by ImageShack.us


A história do cinema que lhe acompanha os dias, está cheia de filmes assim. Não são candidatos a óscares, não são obras-primas, não querem mudar o mundo, não querem mudar ninguém e amanhã, eventualmente já estarão esqucidos. Duram o tempo que duram, servem para o que têm de servir, para ele é remédio santo: derrota do Glorioso, “Notting Hill” a descer da estante.
O cinema também é feito de filmes como “Notting Hill”.
Realizado em 1999 por Roger Michell é feito com competência e se outros motivos não tivesse, teria sempre a Júlia Roberts. Mas tem humor, uns diálogos deliciosos e um “cast” de secundários verdadeiramente notável que representam pequenos papeis ( vejam o inesquecível Spike (Rhys Ifous) o cromo que vive no apartamento de William, o que se queixa que o iogurte tem um sabor esquisito quando simplesmente estava a comer mayonesse) mas que ficam na retina e ajudam a compor.
O filme é a história de Anna Scott (Júlia Roberts) a estrela de cinema mais famosa do mundo, que se apaixona por William Thacker (Hugh Grant, canastrão como sempre), um desastrado e falhado dono de uma livraria especializada em livros de turismo e viagens. Anna Scott ganha rios de dinheiro mas não tem uma vida simples e calma com que sempre sonhou, que encontra sempre uma série de obstáculos ou alguém, como William Thacker que lhe diz que ela é a impossibilidade das impossibilidades: “eu vivo em Notting Hill, tu vives em Beverly Hills, toda a gente no mundo sabe quem és, a minha mãe tem dificuldade em lembrar-se do meu nome “ e ela responde-lhe “os homens comuns podem atingir mais facilmente a felicidade.”
O espectador de cinema que ele é, tem dias em que mora na filosofia e vê-se a concluir que, por vezes, a maior viagem é a distância entre duas pessoas.
“Notting Hill” é um pouco a história da própria Júlia Roberts, perseguida, na América, pelos tablóides por paparazzi, que lhe fazem a vida num inferno e que sempre ambicionou ter uma vida simples, normal mas que tem um desastre de vida que é o preço da fama, o preço que uma das actrizes mais bem pagas de Hollywood tem de pagar. Mesmo que depois se manifeste como uma simples rapariga frente a um rapaz a quem pretende, simplesmente, amar. É a velha história do sol na eira e chuva no nabal, que o dinheiro serve realmente para muita coisa na vida mas que por vezes falha e falha, talvez, nas coisas essenciais.

William Thacker oferece a Ann Scott damascos embebidos em mel e, ao mesmo tempo diz-lhe:
“Damascos embebidos em mel. Porquê.não sei, porque deixam de saber a damascos e ficam a saber a mel e se se quer mel compra-se mel em vez de damascos”
.
Em tempo de desespero (“ela é o rosto que não consigo esquecer”) William percorre os mercados de Portobello Road numa qualquer manhã de sábado onde se vende de tudo, livros, flores, antiguidades e até comida exótica e a fantasia do cinema oferece-nos o passar do tempo durante as quatro estações do ano.

No apartamento de porta azul onde William vive, numa das paredes está um quadro de Marc Chagall “La Mariee”:
Ann Scott - Não acredito que tenhas este quadro!
Wiiliam Thacker – Gostas de Chagall?
Ann Scott – Muito! Tal qual o amor deveria ser, flutuando num céu azul escuro…
William Thacker – Com um bode… a tocar violino.
Ann Scott – A felicidade não existe sem um bode a tocar violino.”

Ann Scott e Wiliiam Tcaker passeiam à noite, num daqueles jardins dos subúrbios ricos de Londres. Passam por um banco de jardim onde se pode ler: “Para a June que amava este jardim. De Joseph que sempre se sentava a seu lado.”
Ann Scott comenta para William Thacker “Ainda há pessoas que passam toda uma vida juntas”.
Sobre isto, o espectador de cinema que é, aindaa morar na filosofia, ocorre-lhe um velho poema do Nuno Júdice:

“Nunca são as coisas mais simples que aparecem

quando as esperamos.
O que é mais simples,como o amor, ou o mais evidente dos sorrisos, não se
encontra no curso previsível da vida. Porém, se
nos distraímos do calendário, ou se o acaso dos passos
nos empurrou para fora do caminho habitual,
então as coisas são outras. Nada do que se espera
transforma o que somos se não for isso:
um desvio no olhar; ou a mão que se demorano teu ombro, forçando uma aproximação
dos lábios.”

Já agora , para que o melaço seja completo, ficam com a letra do “She”, que no filme aparece na versão do Charles Aznavour e do Elvis Costello. É uma canção dolicodoce, melosa, mas de que gosta particularmente. Se quiserem saber, prefere a versão do velho arménio que tem uns calmos 8 e picos anos e que em cada espectáculo que vai fazendo diz que é o último

“Ela é o rosto que não consigo esquecer
um rosto de prazer ou pesar
o meu tesouro ou o preço que terei de pagar
Ela é o espelho do meu sonho
um sorriso reflectido num riacho
Pode ser o esfriar que o Outono traz
pode ser centenas de coisas
No mesmo dia ela pode ser a bela ou o monstro
pode ser a imagem do meu sonho
reflectido num riacho
Ela não pode ser o que aparenta
fechada na sua concha
Ela parecendo sempre tão feliz entra a multidão
cujo olhar é tão misteriosos e tão altivo
que não permite a ninguém vê-la chorar
Ela é o amor que não posso esperar que perdure
Pode surgir-me das sombras do passado
que não esquecerei até ao dia da minha morte
Ela é a razão da minha existência
o motivo pelo qual existo
Aquela que hei-de amar
Nos anos bons e difíceis
Eu sorvo o seu riso
e as suas lágrimas
E faço delas as minhas recordações
Pois onde ela estiver eu terei de estar
O sentido da minha vida
É ela”

2 comentários:

teresa disse...

... e daqui derivando para o Hugh Grant,"as palavras são como as cerejas", considerei um dos pontos altos do humor cinematográfico o discurso de padrinho de casamento que profere no filme "Quatro casamentos e um funeral":)

Anónimo disse...

Bom dia Gin-Tonic,

Além de ter visto o filme e ter gostado, como também dos seus intérpretes, os meus parabéns, por este seu post. Para mim, é bastante interessante.

Continuação de um óptimo dia, para si.

Fernando