1 de janeiro de 2009

O que se aprende com os pescadores!

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Quando aqui postei aquele desafio (chato, mesmo) sobre os azulejos e a vila piscatória, referi um prato típico entre as gentes mais tradicionais da localidade, os pescadores. Relativamente ao mesmo - que me perdoem os mais sensíveis - seguem algumas indicações. A imagem é a do peixe - tipo de cação - utilizado para a confecção da iguaria. Com ajuda, será mais fácil adivinharem de que prato se trata, bem como a vila de que é oriundo. Sendo assim, esqueçamos o azulejo "de pernas para o ar", apesar de o mesmo se encontrar em posição bem superior e central...

Estranho é que numa conhecida praia do litoral português, muito rica em peixes e mariscos nobres, […], um parente do cação […] que dele se distingue por ter as barbatanas peitorais mais pequenas e apresentar, quer no dorso quer nos lados, pintas escuras, seja altamente considerado pelos pescadores locais.
Com a agravante da […] não ser consumida fresca, mas apenas depois de ser submetida a uma cura que dura uma semana, fazendo-a adquirir um aroma muito intenso e característico […]
De forma menos chocante, digamos que […] liberta, antes da cozedura, um intenso cheiro a amoníaco.
Depois de apanhada […] é amanhada e embrulha-se numa saca de serapilheira. Ao fim de três dias, tempera-se com um pouco de sal e volta-se a embrulhar durante mais quatro ou cinco dias, ao fim dos quais se junta mais um pouco de sal. Completada a semana de cura, que deve ser feita em local escuro ou mesmo enterrada […] liberta o tal cheiro a amoníaco.
Depois, em água abundante, coze-se […], que nesta operação perde o cheiro […]. Serve-se com batatas cozidas, tudo temperado com azeite e vinagre. O resultado é um prato simples, em que o peixe tem um aspecto acinzentado e um cheiro levemente amoniacal, de sabor muito intenso e textura macia.
[…] só é preparado sob encomenda e em muito poucos lugares com porta aberta, daí que se deva reservar algum tempo para essa tarefa " sugerem que […] seja acompanhada por um vinho tinto novo, muito encorpado e taninoso.
Parece horrível […]? Parece. Mas e a caça "faisandée"? E os queijos a que os bolores azuis dão odores e sabores saponáceos, como os apreciadíssimos "Roquefort" e "Stilton"? E também não há quem garanta, ante o delícadíssimo paladar e a untuosidade celestial do caviar de esturjão, que, tratando-se de ovas, preferem as de pescada? Como escreveu, com génio, o poeta português Fernando Pessoa, quando provou a Coca-Cola, "a princípio estranha-se, depois entranha-se".
Daí que não se deva desistir à primeira. […] mais do que um petisco com o seu quê de inusitado, pode ser encarada como uma lição contra o preconceito. Ou um hino à diferença. Aí está!
Há na […] uma confraria da […], que assumiu o encargo de preservar e divulgar este prato estranho e raro.


O prato é designado por "Caneja de Infundície" e faz parte da gastronomia típica dos pescadores da Ericeira. (a caneja é o tal tipo de cação)

7 comentários:

MCV disse...

Há tempos andei à procura de quem tal preparasse.
Um dos meus amigos que conhece gente que lá tem casas de comeres, disse-me que era difícil combinar tal repasto.
Será agora mais fácil, já que há gente interessada em manter essa tradição dos jagozes?
Bom Ano Novo

T disse...

Eu fiquei até tonta de tentar adivinhar!E não consegui:)

MCV disse...

Então T., tu que és de saber dessas coisas, arranja um petisco desses para a gente sentir o bafo amoniacal! :)

T disse...

Fica a Teresa encarregue de organizar um almoço de blogue um destes dias com esse petisco!

teresa disse...

Nunca experimentei tal tradição dos jagozes, expressão regional utilizada (e bem) no comentário de MCV...
Quanto à T ficar tonta, pergunto: será pela tentativa de adivinhar ou pela emanação amoniacal sugerida?
Só soube de tal tradição gastronómica há uns anitos atrás, através de alunos que eram filhos de pescadores desta região, embora confesse não me sentir muito motivada para a degustação desta "caçoa" às pintas. Em África, já tentaram que experimentasse umas lagartas que se desenvolvem no tronco de certas árvores, mas sem sucesso, apesar de serem cozinhadas num aromático molho de cebola e tomate:)
Quanto a organizar um almoço, só se a ementa passar no referendo, não quero começar um novo ano a inaugurar inimizades...risos

T disse...

Há alternativas na ementa? Risos.

teresa disse...

Não queria tornar isto num debate político ,mas considero-me uma democrata no verdadeiro sentido da palavra. Vou investigar se haverá mais "originalidades" gastronómicas:)