10 de agosto de 2008

Os dias voam - Rabat

Rabat está para Casablanca como Pretória para Johannesburg. Nada a fazer, as capitais políticas são sempre mais aborrecidas que as económicas (um dos participantes na regata, australiano, diz-me que o mesmo se passa com Camberra e Sidney).

Não conheço Rabat: conheço-lhe o centro, sujo, pobre, barulhento e sem passado; a velha Medina, na qual nos ofereceram uma magnífica recepção num espantoso Ryad dos anos 20 e onde gosto de passear, quando tenho tempo, ao fim do dia; e a Kasbah des Oudayas, uma cidadela fortificada do séc. XI onde ainda se podem ver, em muitas casas, brazões portugueses. Conheço também a simpatia e a hospitalidade dos r'batis, a sua generosidade sem limites.

Mas não conheço Rabat: não sei, ao contrário de Marselha ou Algeciras, o que pensam (e como) os que lá vivem; não sei o que há por trás dos sorrisos e da simpatia. Não gostaria de lá viver, mas isso não é um critério - se fosse, não gostaria de outra cidade que não Lisboa, ou de uma parte de Lisboa.

Marrocos de hoje parece-se muito com Portugal de há 30 anos. Por vezes parece-me que dentro de outros 30 parecer-se-á com o Portugal de então.

Quando querem fazer-nos uma homenagem, convidam-nos para o TGI Friday's.

Cada vez que chego de Marrocos corro para o Snob beber uma cerveja. Noutro dia ocorreu-me que é a melhor parte da viagem. É uma injustiça, mais uma.

Dentro de 10 dias estarei em Salvador: uma cidade à qual tentei resistir, tão inutilmente quanto tentei gostar de Rabat.

É pela palavra que as cidades, como as pessoas, seduzem, e se deixam seduzir.

3 comentários:

T disse...

Grande final:)

Luísa A. disse...

Engraçado, Luís. Também tive a sensação de que esse Marrocos era um prolongamento do Portugal meridional de há uns anos. E também não senti atracção, senão, talvez, pelo exotismo do deserto, mais para Sul. É, sem dúvida, «pela palavra que as cidades, como as pessoas, seduzem, e se deixam seduzir.» Ou pela compreensão e pela adesão ao seu movimento e ao seu «espírito». E eu, decididamente, não entrei na «onda» do Norte de África. :-)

Luís Serpa disse...

Não entro na "onda", como lhe chama, Luísa, do Norte de África (enfim, do Marrocos que conheço) - mais devido às semelhanças com o nosso Portugal do que às diferenças. Não gosto da lentidão, do formalismo, da burocracia, da sujidade das casas de banho, do mau gosto na decoração dos restaurantes, do culto da personalidade do rei. Gosto, em contrapartida, daquilo em que eles são diferentes: a gastronomia, a simpatia e simplicidade das pessoas, a generosidade, a sensualidade da música, a vida nos souks, a decoração dos edifícios (desafio quem quer que seja a não se emocionar com a beleza do ryad onde nos ofereceram a cerimónia de entrega de prémios).

Não são suficientemente diferentes de nós para que os defeitos deixem de o ser, parecia-me por vezes.

Isto dito, o ritmo de mudança é vertiginoso. A primeira vez que fui a Marrocos (a Tânger, admitidamente) foi em 1985. Não era só outro país: era outro mundo. E cada vez que uso a palavra "lentidão" penso que construiram uma Marina em ano e meio, o que compara positivamente, quaisquer que sejam as razões, com os 15 ou 20 anos há que se anda a falar da Marina do Seixal, para não ir muito longe.

Gostava de ir ao deserto, ao Rif, a Marrakech; e estou a pensar seriamente aprender árabe...