5 de setembro de 2010
À procura de um lugar ou como explicar gostos...
(imagem:blogs.inlandslocal)
O que nos leva a eleger um romance, um poema, um filme, um tema musical? Tentamos sempre argumentar e certamente alguns conseguirão aprofundar motivos para as preferências, com toda a subjectividade inerente.
Será difícil encontrar explicações. Há dias uma amiga, a propósito de um importante marco, encomendou uma peça alusiva, a marcar pela diversidade de cores e de texturas… pediu aos próximos que a visitassem e escrevessem sobre as impressões causadas. Lá o fiz, a temer que a conhecida autora venha a ler o que algum improviso e as primeiras sensações me ditaram, tendo o cuidado de justificar, quase como desculpa e antes da pessoal interpretação, as associações estabelecidas…
Quanto à escrita, podemos alegar lugares-comuns como o despertar a sociedade de um entorpecimento, a reflexão, a erudição do escritor (sobretudo no denominado romance histórico) a gerar, no leitor, a curiosidade de aprofundamento sobre épocas e personalidades, a magia do universo construído (em alguns romancistas da América latina) o impulso criativo que leva à junção de palavras ou à construção de expressões até então impensáveis (pensando-se aqui nos eleitos escritores africanos de expressão portuguesa)…
Surgiu o pensamento ao ter revisto há dias o filme Beleza Americana de Sam Mendes, caricatura perturbadora de uma sociedade não muito distante da nossa …
Subitamente, desfilaram pensamentos e associações, tendo evocado uma experiência em sala de aula: no tempo restante e como motivação à leitura os jovens, perto do final de uma meta escolar , contactaram com escritores da nossa actualidade, através de momentos de leitura partilhada. O romance era como que um safanão (à semelhança do filme de Mendes) e, no final de uma das sessões, fui discretamente interpelada por uma jovem «sei que muitos estão a apreciar, mas a vida já é tão difícil, fico deprimida sempre que se avança neste enredo»…
Muito se tem escrito sobre a arte, se terá a mesma alguma função e, não querendo entrar em terrenos movediços, fui ontem surpreendida por um outro filme do mesmo realizador de ascendência madeirense, este datado de 2009 e que , a título pessoal, tinha passado despercebido. Refiro-me a Away we go ("Um lugar para viver", no título traduzido). A aparente simplicidade de uma história bem contada, a escolha de personagens com observações mais ou menos embaraçosas, algumas algo estereotipadas a fazerem-nos lembrar conhecidos e, notória, a banda sonora do filme, a revelar pessoalmente o compositor Alexi Murdoch.
Sendo uma história aparentemente simples e com um final de reconciliação com um passado de perdas a marcar, ao longo dos tempos, o percurso da protagonista, acaba-se ainda a concluir que é apelativo num realizador a sua capacidade de nos surpreender pela positiva, pois vai para além do contar a mesma história de modos diversos.
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4 comentários:
Há umas semanas, à procura de um trailler de um filme alemão dei de caras com "Auf nach Irgendwo". Como não gosto de filmes dobrados, nem sequer os "traillers", fui à procura no original (away we go)e fiquei com uma vontade enorme de o ver. Agora que o vejo aqui mencionado, ainda mais vontade tenho... Decididamente tenho que me fazer sócia de um clube de vídeo...
Quanto à pergunta "por que é que gostas (do quadro, da música, do livro...)?" eu dou a única resposta que não que não aceito em nenhum outro contexto da vida: 'Porque sim!'. :D
Eu gostei do filme que só ontem vi, Luísa... mas isto de criar expectativas é de grande responsabilidade, pois há o tal factor subjectivo... espero que goste, logo me dirá! :)
Por mim, sobretudo para pintura/escultura (e por não ser dada a pensar em valores no mercado nem ter estatuto para tal), o critério é pensar que não me cansariam caso as tivesse em casa (critério simples para quem nada percebe de artes plásticas).
Quanto aos livros e por defeito vocacional (aqui fala quem estudou literatura), há sempre o defeito irritante (para terceiros) de os tentar dissecar (a não ser para quem passou pelo mesmo):)
Relativamente à música a questão parece-me muito mais escorregadia, pois a extrema simplicidade ou a elaboração muito complexa atraem da mesma forma (desde que haja o inexplicável "clic"), sendo mais difícil a explicação.
Pois esse tal clic que a Teresa menciona é o meu "porque sim". Para bem ser o que é um "clic"?!? Supostramente é uma onomatopeia... :D :D :D
Quanto a dissecar livros, eu sei do que fala. Faço o mesmo!! Quanto vou a 200 à hora é que penso que nem todos são como eu, não estudaram literatura nem estão para aí virados, qeu simplesmente querem que eu diga se o livro´´e "porreiro" ou uma "grande seca"... Assim, desde há um tempo para cá que tento ignorar o que sei sobre literatura e colocar-me na pele de quem poderá vir a ler o livro. Raramente consigo... :s
Um outro problema de se ter estudado literatura é que se perde muito do prazer de ler só por ler. De vez em quando lá dou comigo a pensar "ironia bem apresentada", "construção frásica que deixa a desejar", "porque raio me parece que isto foi copiado do autor X?"... Mas pronto... não se pode ligar e desligar o nosso conhecimento quaqndo se quer ler um livro...
Luísa, quanto à tua frase: "Um outro problema de se ter estudado literatura é que se perde muito do prazer de ler só por ler"; como bem a atendo!
Não sei se o meu exemplo servir-te-á de alguma coisa, mas passo a descrevê-lo.
Quando vou ver uma exposição percorro-a toda, observando-a ao mais ínfimo pormenor. Vejo que materiais usaram, que soluções de suspensão utilizaram, quais foram as opções de iluminação, como resolveram o problema das legendas, que bases colocaram às peças, com que tipo de tinta e com que paleta de cores pintaram o espaço, meço com os olhos os espaços, verifico as verticais e as horizontais, confirmo a existência de climatização, etc. etc. etc., há quem diga que até cheiro os cantos à exposição.
Exausto, saiu para a rua, fumo um cigarro, tomo um café ou uma água, respiro e volto a entrar para poder, finalmente, apreciar a exposição, apreender a informação, fruir o espaço, enfim, tirar gozo do discurso expositivo apresentado.
Espero ter ajudado! Há sempre uma maneira de dar a volta aos ‘ossos do ofício’!
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