27 de outubro de 2009

A CIDADE É A EXPERIÊNCIA QUE DELA TEMOS

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Ele sabia que o encontraria mal o tempo começasse a mudar.
Quando há dias caiu aquela aquela forte pancada de água, chegou a pensar que chuva finalmente viera para ficar, já estava o homem das castanhas na esquina da Avª Paris com a Praça de Londres. Mas nesse dia não levava a máquina.
Acontece que a chuva não continuou e o Outono tornou-se ainda mais estival, agora que se aproxima o tal Verão de S. Martinho. Mas o homem das castanhas já não volta atrás. Ali ficará até ao dia em que chegue o tempo dos gelados e procederá, então, às adequadas modificações no seu triciclo.
Fez os bonecos que havia para fazer e regressou a casa a lembrar-se da canção do Ary com música do Paulo de Carvalho e que o Carlos do Carmo deixou registado em “Um Homem na Cidade”.

“Na Praça da Figueira,
ou no Jardim da Estrela,
num fogareiro aceso é que ele arde.
Ao canto do Outono, à esquina do Inverno,
o homem das castanhas é eterno.
Não tem eira nem beira, nem guarida,
e apregoa como um desafio.
É um cartucho pardo a sua vida,
e, se não mata a fome, mata o frio.
Um carro que se empurra,
um chapéu esburacado,
no peito uma castanha que não arde.
Tem a chuva nos olhos e tem o ar cansado
o homem que apregoa ao fim da tarde.
Ao pé dum candeeiro acaba o dia,
voz rouca com o travo da pobreza.
Apregoa pedaços de alegria,
e à noite vai dormir com a tristeza.
Quem quer quentes e boas, quentinhas?
A estalarem cinzentas, na brasa.
Quem quer quentes e boas, quentinhas?
Quem compra leva mais calor p'ra casa.
A mágoa que transporta a miséria ambulante,
passeia na cidade o dia inteiro.
É como se empurrasse o Outono diante;
é como se empurrasse o nevoeiro.
Quem sabe a desventura do seu fado?
Quem olha para o homem das castanhas?
Nunca ninguém pensou que ali ao lado
ardem no fogareiro dores tamanhas.
Quem quer quentes e boas, quentinhas?
A estalarem cinzentas, na brasa.
Quem quer quentes e boas, quentinhas?
Quem compra leva mais amor p'ra casa.”

1 comentário:

Luísa disse...

Quando eu morava em Lisboa, tinha o hábito de ir a este canto comprar castanhas. Este mês estive em Lisboa, mas com o calor que esteve... nem me lembrei que era tempo de castanhas (mas, entretanto, já as comi à beira do lago de Zurique, num dia frio e molhado!!).
Apesar de não ser o mesmo que saborear as castanhas enquanto se sobe a Avenida de Roma, soube-me bem este 'post'. Obrigada!