20 de julho de 2009

Aos vindouros, se os houver...

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Rómulo de Carvalho em O Astronauta e os Descobrimentos afirma que a maior aventura do Homem continua a ser a dos Descobrimentos Marítimos dos séculos XV e XVI. Incapaz de tomar partido - ambas as aventuras permitiram "o grande passo para a Humanidade"-, passo a transcrever um trecho (opinião pessoal e subjectiva) marcante:

Era uma vez um povo de marinheiros e de guerreiros, o povo português. Levados pela procura de riqueza e de novas terras, aventuraram-se no Oceano desconhecido, em direcção ao horizonte.
Em contrapartida, a descoberta espacial. A busca pelo conhecimento, pela descoberta. A procura incansável e inatingível pelo saber absoluto.
Qual delas a mais gloriosa? Qual delas a derradeira aventura do homem?
Em nada se comparam as épocas das duas viagens. Por um lado século XV. Tempo em que o Oceano era o desconhecido, o obscuro. Tempo de crenças inimagináveis, hoje em dia. Tempo em que viajar no mar era nada mais do que provocar a morte.
Por outro, século XX – Todas as crenças mitológicas ultrapassadas, avanço tecnológico, mais condições. E, mais uma vez, alguém sonhou ir mais longe, quebrar os padrões do impossível. E eis que chegámos ao Espaço.
Apesar de tudo, na minha opinião, os Descobrimentos Marítimos são a maior aventura da humanidade. Não é possível comparar uma caravela com uma nave espacial, esperar encontrar monstros, gigantes e afins e esperar que tudo corra bem para regressar a casa rapidamente.
Mas, é certo, nada iguala a coragem, a determinação daqueles homens, tanto marinheiros como astronautas. E os feitos do passado são um exemplo para nós, actualmente. Não há limite para sonhar, não há limite para conseguir.
“Deus quer, o homem sonha, a obra nasce.”
in bookcrossingBI
Sendo provavelmente o poema O Mostrengo de Fernando Pessoa a ligação mais óbvia com as afirmações transcritas, a conclusão pessoal será a de que uns - os navegantes marítimos - terão preparado caminho a outros - os homens do espaço, o que conduz (a título pessoal) de imediato ao marcante poema de Alexandre O'Neill:

Aos vindouros, se os houver

Vós, que trabalhais só duas horas
a ver trabalhar a cibernética,
que não deixais o átomo a desoras
na gandaia, pois tendes uma ética;

que do amor sabeis o ponto e a vírgula
e vos engalfinhais livres de medo,
sem peçários, calendários, Pílula,
jaculatórias fora, tarde ou cedo;

computai, computai a nossa falha
sem perfurar demais vossa memória,
que nós fomos pràqui uma gentalha
a fazer passamanes com a história;

que nós fomos (fatal necessidade!)
quadrúmanos da vossa humanidade.

Alexandre O'Neill

10 comentários:

entremares disse...

Li isto e veio-me à memória uma das cenas ( para mim, a melhor ) do 2001, Odisseia no espaço, quando o macaco olha para o osso, pela primeira vez e "percebe" algo... quando o olhar se ilumina e ele brande o fruto da sua conquista...

Tudo é impossível, até ser conquistado.

A terra, o mar, o espaço. Tudo.

Um abraço.

teresa disse...

Uma associação bastante sugestiva, entremares.
Quanto ao poema de O'Neill que já tem alguns anitos, considero-o fantástico, pois é uma projecção de uma visão muito lúcida na maior movimentação épica que consigo abarcar - o percurso encetado 'desde o primeiro momento' pela Humanidade, com todas as interrogações inerentes quando pensamos no futuro.
Abraço.

César Ramos disse...

O' Neill escreveu algures que "é preiso 'desimportantizar' as coisas..."

Para mim é sempre importante e bom vêr lembrado o nome do meu Prof. de Ciências Físico-Químicas, Dr. Rómulo de Carvalho, o António Gedeão da 'Pedra Filosofal' [e muito mais]...

Discreto grande Senhor, trazia sempre montes de papéis debaixo do braço; e dizia eu para os meus colegas: O 'Stôr' de certeza é escritor...

'Discípulo' dele até ao fim, era por Campo de Ourique, Lisboa, que tínhamos as nossas conversas e eu recebia os seus conselhos amigos.

teresa disse...

Que privilégio, César Ramos, ter convivido com alguém como Rómulo/António.
Certamente que muitas dessas conversas terão ficado na memória.
Tive diversos professores-escritores na faculdade, mas os que mais abriram horizontes terão sido os de Filosofia, no liceu, bem como uma professora de Inglês que, ao fim de 20 anos, ainda me reconheceu e se lembrou do meu nome (eu nem queria acreditar...), o que levou a que perpetuássemos a nossa amizade até hoje.
Quanto ao O'Neill, recordo ainda tê-lo visto no café Monte Carlo.

Unknown disse...

Bom dia.
Partilho dessa visão.
E quando digo que os três (não um, nem dois) astronautas são dignos sucessores de Dias, Gama e Cabral & C.ia é apenas pela ordem cronológica do seu aparecimento.

Verdadeiros heróis.

gin-tonic disse...

Uma noite branca, passada em branco, gravada na memória. O juntar o poema do O'Neill é um belo achado.
Um abraço

César Ramos disse...

Teresa,

Olhe outro nome com quem tive o privilégio de privar
[questão de gosto]:
- Vasco Granja!... meu 'cumprimento' de Campo de Ourique, e mais tarde na Amadora.

Dediquei-lhe um humilde post intitulado 'Obituário', no dia 8 de Maio p.p.

Esta Gente está a fazer-me falta!

teresa disse...

Também aqui referimos Vasco Granja. O meu pai, prematuramente reformado mas nunca acomodado, fez parte de uma cooperativa de cinema associada a filmes e cinema de animação de países menos 'comerciais', digamos assim, e, por isso mesmo, acabou por conviver durante algum tempo com Vasco Granja.

César Ramos disse...

Teresa,

Corre-se o risco de dizer que o mundo é pequeno.

Não é nada!... é enorme!... estas pessoas que tivémos a sorte de conhecer é que são de uma tal Estatura,... que tudo parece minúsculo à sua volta!

Por elas, jamais perderei a Fé
na Humanidade(...)

César Ramos disse...

Teresa,

Corre-se o risco de dizer que o mundo é pequeno.

Não é nada!... é enorme!... estas pessoas que tivémos a sorte de conhecer é que são de uma tal Estatura,... que tudo parece minúsculo à sua volta!

Por elas, jamais perderei a Fé
na Humanidade(...)