Há uns tempos atrás numa palestra em casa de amigos, um jornalista importante revelava-nos que por vezes os principais orgãos de comunicação social portugueses acordavam em não noticiar mais em primeira página este ou aquele assunto, ou em pura e simplesmente omitir um ou outro facto. Um exemplo que esse jornalista nos deu foi o de um dos processos em tribunal entre Clinton e uma das estagiárias. A história prolongava-se na América mas, a partir de certa semana, os principais jornais portugueses acordaram em não fazer qualquer referência ao caso em primeira página. O jornalista disse-nos que estes acordos entre jornais não precisavam de ter nada a ver com opções políticas ou escolhas estéticas. Normalmente o que acontecia era que os jornalistas achavam que não se devia "cansar mais os portugueses" com este ou aquele assunto.
Recentemente suspeito que terá havido qualquer conluio a respeito das consequências da descida abrupta do avião que se dirigia para os Açores e que, alegadamente, tentava desviar-se de outro. A primeira informação que normalmente é dada em notícias sobre acidentes é, por esta ordem, o número de mortos, o número de feridos graves e o número de feridos ligeiros. No caso recente do avião, estas informações começaram por não ser dadas e depois foram-no de modo muito discreto. Na televisão, as únicas imagens transmitidas que poderiam provocar alguma inquietação limitaram-se a 2 ou 3 segundos em que se via alguém a ser descido do avião para terra de maca.
Ainda não pensei muito sobre as consequências dos conluios entre jornais e/ou televisões mas, à primeira intuição não me agradam nada: os conjurados, enquanto grupo, acabam por ter um poder ainda maior do que a soma dos seus poderes individuais; não me agrada também nada a ideia de os jornais serem paternalistas e decidirem o que é que os portugueses deverão achar interessante ou desinteressante, bonito ou feio, cansativo ou empolgante. A concorrência é boa e necessária para que os mercados funcionem bem (funcionar bem significa aumentar o bem-estar social) e, ao contrário do que se diz, o mercado de informação, o mercado de jornais e o mercado de televisões em canal aberto são mercados normalíssimos que podem e devem ser concorrenciais como qual outro mercado mais banal (o de champôs ou o de batatas).
p.s.: Revelar o que o jornalista disse em conversa privada é uma coisa que não se deve fazer mas é a desonestidade mais típica e que mais rende à quase totalidade de jornalistas existentes em quase toda a parte.
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