31 de agosto de 2003

Ideias para dias quentes de verão (6)

Tenho alma de escritor. Desta maneira faço mais uma confissão: sou um presumido.
Mas sinto mesmo que tenho. Vem de há três ou quatro anos, ou talvez desde há mais, desde sempre e eu não notava. Ou simplesmente não queria, ou não sabia notar.
Agora sinto-o, noto-o. Há alturas em que tenho ideias que me chegam à cabeça, que nem raios ou sopros de vento, que me bailam na cabeça, tomam forma, mudam e transforma-se às vezes em páginas escritas, outras vezes em delírios... Mas não param de chegar e às vezes vão-se embora, fogem, dizem adeus... para não voltar ou regressarem dias depois. Há personagens que vêm de repente, sem dizer nada, sem avisar e também se instalam, falam comigo e dizem-me “ escreve-me... escreve-me!” ou chamam-me cabrão e gritam-me “deixa-me voar”... E ficam ali por uns dias instalados ou voam para outros lados. E às vezes não voltam...
Nestas alturas fico febril, angustiado... dantes ficava contente, quietinho, só a imaginar. Agora não, angustio-me, quero ficar com qualquer coisa, um esboço, um vulto, algo que mais tarde me lembre, e escrevo papelinhos, agendas, qualquer coisa. Nestes dias escreveria livros imensos de todas as cores!
A angústia ocorre porque sei que virão os dias chuvosos, frios, cinzentos, em que as ideias me abandonam, os vultos migram para sul e eu nem meia página escreveria. Um livro dessa altura serio “O Livro a Cinzento” dos dias cinzentos de Inverno, da alma cinzenta...

Última confissão do dia: ao falar de almas lembrei-me do livro “Alma de Pássaro” da Rebelo Pinto. Já li e, apesar de ser o tal estilo que o Orlando bem define como Urbano Porra-louca, li com algum agrado. Duas razões: ao menos ela é assumidamente autobiográfica. A segunda é que também tenho um alma de pássaro, às vezes de águia, a maioria das vezes de mero pardal!

PP: Continuo a descobrir histórias extraordinárias da minha família. Ontem foi de uma minha trisavó, Maria do Patrocínio, que nasceu ali para os lados de Marvão, talvez em 1860. Viúva cedo, meio pobre, rancho de filhos, vida dura. Casou de novo, agora com homem mais abastado e deve ter sido bom, de tal modo que um dos filhos dela (o meu bisavô Ventura) casou com uma das filhas dele (a minha bisavó Emília). Assim era como se fosse madrasta/mãe e sogra da sua nora e enteada/filha. E era como se a minha avó só tivesse um avô e uma avó... (confuso?). Isto acabou em tragédia: anos mais tarde um neto, que era pobrezinho e alcoólico (os males da altura) matou a minha trisavó Mª do Patrocínio para lhe roubar um fio de ouro. Este neto passou vinte anos na cadeia, saiu, foi repudiado pela família e matou-se ao atirar-se para debaixo de uma camioneta da Setubalense...

PPP: Era para linkar a Rebelo Pinto mas encontrei outro que me pareceu interessante...

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