9 de junho de 2009
Da poesia de David Mestre até Lucira
Num dia soalheiro de 1980 a chegada, com um pequeno grupo, à pequena povoação de Lucira, no Sul de Angola. Trata-se de uma pequena aldeia de litoral e os donos da casa, um casal de idade, receberam-nos com uma hospitalidade generosa pois, à excepção de um dos membros mais novos da família, nem sequer nos conheciam.
Contentes com a chegada de visitantes, cederam-nos os melhores aposentos, não admitindo, sequer, uma recusa. Fiquei surpreendida quando me disseram serem naturais da terra do meu avô V., embora de outra freguesia.
A casa obedecia à traça de uma casa do Minho e, na inexistência de uvas, faziam vinho com frutos tropicais (ensinaram-me a técnica, mas nunca consegui obter os bons resultados). No dia seguinte, domingo, levaram-nos até ao mato onde apareceram umas figuras – semelhantes à da capa – vestidas de sisal, designadas por “xingães” ou “jingães” (desconheço a grafia, pois em lado algum a consegui encontrar).
Deram início a um estranho ritual de dança, ao som de rudimentares instrumentos de percussão. Perguntei aos amáveis anfitriões se conheciam os protagonistas, tendo obtido como resposta que não sabiam quem eram, embora todas as semanas, à mesma hora, com ou sem assistência, executavam aquele bailado no meio do mato desaparecendo, misteriosamente, de seguida.
Tinha pensado em postar exclusivamente o poema, motivada pelo colorido da capa, mas a figura representada acabou por me trazer esta memória associada a uma região caracterizada por alguma beleza e de um isolamento indescritível.
O poeta deve
manter-se perfilado
em andamento
respeitar o sinal
no cruzamento
manejar assim
o armamento
saber guardar
recolhimento
e não deve
tocar douvido
o instrumento
extraviar
o fardamento
com prometer
o cumprimento
deste burocrático
regulamento
David Mestre
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