22 de março de 2009

Procura-se autoria...

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(fonte: xafarica.weblog.com)

E assim, pouco a pouco, resvalei até este cómodo estado de admitir sem indignação todas as mesquinhas infâmias do dia-a-dia que, em tempos anteriores, segundo garantem os poucos cavaleiros andantes sobreviventes, provocavam, por via de regra, embates, socos e mãos de polícia a apartar.
Hoje não. Ainda esta manhã vi um brutamontes, com olheiras de tanguista e ombros de moço de recados, atirar um encontrão a uma velhota para lhe roubar o lugar no eléctrico, e ninguém soltou um pio.
A pobre senhora, meio tonta, alheada do que se passava em redor, escancarou os olhos numa fixidez de assombro diante do burburinho do mundo.
Alguns empalideceram. Oh, sim, alguns ficaram brancos de cal e cravaram unhas enfurecidas nas palmas das mãos.
Mas o grito não se ouviu.
Bico calado. Ausência completa de dons-quixotes. Todos a pensarem nas vidinhas, nos destinos exíguos ao molde da alma de cada um.
Que lhes importavam o atropelo, a prepotência, o pontapé nas canelas do vizinho, o insulto, a calúnia, o apalpão impotente, o abuso do mais forte, as rasteiras e os pinhões nos velhos?
Alguns – coitados - , os derradeiros quixotes pusilânimes, empalideceram. Outros tornaram-se verdes, a expelir as clássicas labaredas pelos olhos.
Mas todos acabaram por engolir o grito e passar adiante…
Porque os portugueses de hoje, infelizmente, passam sempre adiante.

Pergunta: Quem foi o autor destas linhas?
O autor deste excerto é o escritor José Gomes Ferreira.

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