(continuação)
Subitamente, abriu-se a porta.
- Bom dia, nosso Primeiro Sócrates – cantaram todos a uma só voz sem excepção, embora Teixeira dos Santos continuasse a dar voltas à máquina calculadora.
- Bom dia, meus ministros. Tudo porreiro?
- Tudo, Primeiro Sócrates!
- Bom, vamos lá despachar com isto que tenho de ir a uma exposição de clips retorcidos e quero chegar lá a tempo de ainda aparecer em directo nos telejornais da hora de almoço. Como sabem, de vez em quando, lá temos de organizar uma ofensiva contra os direitos dos trabalhadores. Há muito tempo que não fazemos uma coisa em grande e nada me ocorre. Alguém sugere alguma coisa?
- O Teixeira tem uma ideia nova, meu Primeiro – disse, apressado, Vieira da Silva.
- Ai sim Teixeira! – exclamou, surpreendido, José Sócrates. – Só espero é que não seja outra vez a baixa de impostos que a gente está aqui é para limpar a carteira dos portugueses. Ainda tenho aquela do 1 por cento do IVA atravessada na garganta. Só te perdoei porque com menos 1 por cento de IVA vamos ter mais um por cento nas receitas das empresas para taxar de IRS e IRC.... ahahahahahah...
- Bom, meu Primeiro – balbuciou Teixeira dos Santos, enquanto a sua memória revivia os palmadões que levara no rabo no dia em que decidira baixar o IVA. – Acho que devíamos taxar os portugueses que se peidam em público, aqueles vêm para a rua com mau hálito e aqueles que falam muito alto nas ruas. Isto seguindo o princípio do poluidor-pagador, como é óbvio.
Sócrates fez uma pausa. Olhou Teixeira dos Santos como se quisesse entrar na sua mente e ver que número de défice bailava nos pensamentos do seu ministro. Teixeira, assustado, baixou os olhos e apertou as nádegas, temendo o pior.
- ó Santinhos – disse Sócrates, paternalista, procurando tranquilizar o homem de cabelo branco – em que é que isso é uma grave ofensiva aos direitos dos trabalhadores? Eu julguei que tinha sido claro. Pedro... Pedro... eu fui claro, não fui, Pedro?
- Claro, meu Primeiro Sócrates. Aliás, como sempre. O meu Primeiro é claro como a água do Alqueva, essa grande obra que o nosso governo acabou depois de tantos anos... como a água do Alqueva, meu Primeiro... – respondeu Pedro Silva Pereira, fazendo repetidas vénias...
- Bom! Vá lá malta porreira. Não me digam que...
Sócrates não acabou a frase. O seu telefone privado tocou.
- Estou sim! Aqui Sócrates.... ahhh olá, António, bom dia...... Tudo porreiro.....Olha, aquela história da frente ribeirinha de Lisboa vai ter de esperar, ok?.... pois vai ter de ser.... sim, estamos a falar das ofensivas......o quê?.... uma carga policial?..... ahahahahahah... mas porquê?....... nos professores?..... ahahahahahahahahaha.... isso não, pá... os gajos têm cabeça dura. Ainda nos partem os cassetetes... ahahahahahahahah Entramos em despesas e o Santinhos diz que não se pode gastar tuste... ahahahahahahahahaha...
O riso alastrou de novo à sala... Vieira da Silva e Alberto Costa davam calduços na nuca de Teixeira dos Santos. Numa ponta da mesa, Mário Lino tentava estudar para um exame de francês, mas era impossível. Aquele estava a ser um dos mais divertidos conselhos de ministros de que havia memória.
- Além de que acho que já houve a manifestação.... – esclareceu Sócrates – já houve sim... andas muito desatento... olha lá... António... devias fazer uma carga policial era em casa....ahahahahahahahah.... para a tua mulher não andar em manifestações contra este governo..... ahahahahahahaha
A sala pareceu explodir em gargalhadas enlouquecidas. António Costa, do outro lado da linha, fez silêncio. Revoltado, quis muito voltar atrás no tempo para poder participar de novo nas reuniões das ofensivas. As melhores de todas as reuniões!
- Vá, António... essa história das cargas policiais era com o Cavaco... comigo é diferente. Vá, agora deixa-me trabalhar... como dizia o outro...
(continua)
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