21 de março de 2007
Eu não sou supersticiosa!
"Noutros tempos ninguém encetava trabalho ou negócio à sexta feira ou à terça, por serem dias aziagos.
Também ninguém se lavava na água já usada por outrem, por temor a desavenças.
Um cão a uivar trazia presságio funesto e o azeite entornado ou vidros partidos também.
Que dizer então da galinha que cantasse como o galo? Tinha de se lhe cortar logo o pescoço, quando não adivinhava a morte do dono.
Se o pão caía da mão, quando se ia comê-lo, era sinal de que alguém nos queria falar e não podia.
Varrer a casa à noite e deitar o lixo fora equivalia a deitar fora a fortuna , o mesmo se dando quando se punha termo à existência de uma aranha, depois de as luzes estarem acesas- a morte do bicho fazia com que a fortuna se escapulisse.
Em compensação ervilhas de nove bagas, nozes de três esquinas e trevos de quatro folhas eram portadores de mil venturas.
(....)
Quando se sentia uma orelha a arder era sinal que estavam a falar de nós: se era a direita estavam a cortar-nos na casaca, se era a esquerda a dizer bem.
Comichão na palma da mão era sinal de dinheiro fresco e andar de guarda-chuva aberto dentro de casa vaticínio de contrariedade iminente.
Se uma varejeira no seu enervante circular entrasse em casa era aviso certo da chegada de presente ou de visita. As visitas eram também previstas pelos gatos, quando se punham a lavar a cara. Por sinal que se, em seu afâ passavam a mão por trás das orelhas , podia-se estar certo que era visita de "Toucador".
E os sonhos? (...)
Sonhar com cabelos era prenúncio de grossa intrigalhada: sonhar com dentes morte de parentes e com o próprio falecimento sinal de vida. Sonhar com galinhas ou com sapatos era de arrepelar, pois acarretavam cargas de trabalhos, fosse com penas( desgostos) fosse por ter de fazer longas caminhadas para conjurar perigos.
Sonhar com riqueza era miséria, mas sonhar com imundícies anunciava prosperidade e fortuna. E a propósito, contava-se logo de um ou de outro a quem saíra a sorte grande e que na véspera levava a noite toda a sonhar com estrume"
Mário de Sampayo Ribeiro,
Ciclo de Conferências O Pitoresco em Lisboa, Olisipo, Abril de 1952
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