19 de abril de 2016

O jardim do Príncipe Real em 'A Cavalo no Diabo'


“Se há jardim de Lisboa que me dê gosto maior é o do Príncipe Real. Primeiro, por causa da árvore-mãe que tem ao centro, baixinha e de ventre antigo, e de ramagem tão extensa que dá abrigo a meio mundo. Depois, porque o conheci rodeado de poetas, uns em verso, outros em prosa: O’Neill morou-lhe quase em frente, na Rua da Escola Politécnica, Vieira de Almeida mesmo ao lado. Ruy Cinatti na Rua da Palmeira e Agostinho da Silva na Travessa do Abarracamento de Peniche, que é um recanto pacífico para meditar. Isso para não falar já do poeta real que se chamava Mendonça e que nunca escreveu coisíssima nenhuma na vida, pelo menos que se saiba. Fizemo-lo poeta, eu e alguns amigos, porque se passeava no jardim acompanhado de um pato negro, com a solenidade de um letrado do Olimpo. Alguém que numa cidade se passeia com um pato é poeta ou tem alma disso. No entanto, se nós, em vez de poeta, o tivéssemos feito Príncipe Real também não ficaria pior, porque condizia com a majestade com que ele atravessava a paisagem.”

 José Cardoso Pires, "O Príncipe Real" em A Cavalo no Diabo

Fotografia: Armando Serôdio, 1959, "biblioteca municipal no jardim do Príncipe Real" - Arquivo Municipal de Lisboa

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