12 de outubro de 2013

Leminski Assumpção Duncan


Elegância

Paulo Leminski, Itamar Assumpção e Zélia Duncan.
A poesia e a música que os une também nos salva o dia.  

Itamar Assumpção era o que se pode chamar de um negro elegante. Brilhante. Ousado. Altivo e provocante. Deixou a faculdade para ser cantor. O mundo perdeu um contador e ganhou um artista. Itamar viveu pouco, rápido e intensamente. Morreu aos 54, esse bisneto de angolanos, que trouxe a música na alma.

Nas décadas de 70 - 80, do Século passado, liderou um movimento que ficou conhecido como "Vanguarda Paulista", junto com outros artistas que não se submetiam às regras das grandes gravadoras. Criaram um circuito alternativo do qual ele era "pule de dez".

No caminho, cruzou com outro gênio - da poesia - Paulo Leminski. Do cruzamento dos dois surgiram algumas peças memoráveis. Uma delas transcrevo agora e Itamar canta depois.

Um homem com uma dor
é muito mais elegante
caminha assim de lado
como se chegasse atrasado
andasse mais adiante

carrega o peso da dor
como se portasse medalhas
uma coroa um milhão de dólares
ou coisa que os valha

ópios édens analgésicos
não me toquem nessa dor
ela é tudo que me sobra
sofrer vai ser minha última obra

Leminski/Assumpção


Não é por ai

Itamar veio muito a Brasília. E aqui conheceu Zélia Duncan. Ele vinha pra ficar uns dias, ficava muitos. Não queria hotel, queria a casa de amigos. Demorava pra ir embora. Aproveitava a estada pra observar o céu do planalto, o horizonte e as linhas da arquitetura de Oscar Niemeyer. Invariavelmente, cantava. E cantou tanto com Zélia que ela passou a ser guardiã do seu precioso relicário musical. 

Dias destes, não faz muito tempo, Zélia gravou um disco só com músicas de Itamar. Ninguém tem mais autoridade que ela pra fazer isso. Em ninguém a música dele se encaixa tão bem quanto na voz dela.  Das tantas coisas lindas que ele fez Não é por ai soa como se nunca tivesse sido de outra pessoa, senão de Zélia.


Ia dizendo

Não é por aí

O caminho mais curto

Acaba logo ali,

Acaba logo ali


Acontece que algum gesto ainda não foi feito

Hei, não vá saindo assim desse jeito


Pra que pressa?

Depois dessa

Outra história,
outra transa,
outra festa


Agora é tarde

Não está mais aqui quem falhou
Agora é tarde
Ia dizendo, 
não é por aí

Itamar Assumpção

1 comentário:

AnaMar (pseudónimo) disse...

Belíssimo. Gosto muito de Zélia Duncan