27 de outubro de 2013

As Centenárias

«Um Beckett sertanejo que traz a inexorabilidade de nosso fim, mas com diversão e picardia» (Newton Moreno)

Zaninha e Socorro são duas carpideiras centenárias do interior do nordeste brasileiro que entoam incelências (cânticos em virtude dos falecidos) e choram a morte dos outros, ajudando-os a “passar para o outro lado”. 
Nestas suas viagens pelo sertão brasileiro vão criando uma ligação única, que as converte numa dupla muito especial. No entanto, e paradoxalmente, estas duas “antigas” mulheres temem a morte e vão fazer tudo o que estiver ao seu alcance para dela escapar.

“As centenárias”, espetáculo com encenação de Natália Luiza e interpretação de Catarina Guerreiro, Flávia Gusmão e Sílvia Filipe poderá ser visto até dia 10 de Novembro no Teatro Meridional.
O espaço onde se desenvolve a ação é quase sonhado, onírico, meio sombrio e incerto; mas que ao mesmo tempo, com o desenrolar da história se vai transformando em “todos os lugares”.

"As Centenárias"-Fotografia Nuno Figueira

De acordo com Natália Luiza, o mote para a escolha desta peça de Newton Moreno foi, não só a oportunidade de trazer a palco um português cuja musicalidade homenageia a nossa língua e nos leva a outros lugares; mas também a necessidade de contar uma história que nos ponha em confronto com a morte, condição a que todos igualmente estamos sujeitos.
O sotaque do nordeste dá uma dimensão enternecedora, mas também divertida às personagens, já que para Natália Luiza: “fazê-lo de outro modo seria escrever outro texto”.
As carpideiras personificam-nos, simbolizam a nossa dificuldade de enfrentar a condição finita que nos assiste: ainda que o “nada” atemorize é também ele que nos define.
 Estas personagens levam à reflexão inevitável sobre a necessidade do choro e do luto, num mundo onde se reprimem as emoções e tudo acontece a uma velocidade desarmante. 


"As Centenárias- imagem de Nuno Figueira"

Deparamo-nos com uma história fechada, que contraria de forma assumida as narrativas fragmentadas e de livre interpretação.
 Este espetáculo compromete-se, estrutura-nos, dá-nos referências e princípios muito claros, sem por isso nos tirar a individualidade.

De forma subtil vamo-nos questionando sobre a efemeridade da vida, o luto, o silêncio e a forma como a amizade – personificada através de Zaninha e Socorro – pode ter um papel estruturante e fazer a diferença enquanto nos vamos escapando da morte. 

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