8 de abril de 2010
Alentejo ou o tempo das cigarras
Quando voltar ao Alentejo as cigarras já terão morrido. Passaram o verão todo a transformar a luz em canto - não sei de destino mais glorioso. Quem lá encontraremos, pela certa, são aquelas mulheres envolvidas na sombra dos seus lutos, como se a terra lhes tivesse morrido e para todo o sempre se quedassem órfãs. Não as veremos apenas em Barrancos ou em Castro Laboreiro, elas estão em toda a parte onde nasce o sol: em Cória ou Catânia, em Mistras ou Santa Clara del Cobre, em Varchats ou Beni Mellal, porque elas são as mães. […]Solitárias ou inumeráveis, aí as tens na tua frente, graves, caladas, quase solenes na sua imobilidade, esquecidas de que foram o primeiro orvalho do homem, a primeira luz. […]
Eugénio de Andrade, Vertentes do olhar (excerto)
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4 comentários:
Saudades do Alentejo?
Kisses.
Já estou com saudades , principalmente dos sons do silêncio, como lhes chamo (muita rã, muito melro, etc.).
Bjinhos:)
Quando voltamos ao Alentejo raramente observamos já essas mulheres de luto. Para as ver mos in locco é visitar Toronto ou Montreal: observei lá algumas em 2004. Por alturas da Páscoa precisamente. Nessas comunidades distantes sobrevivem certos hábitos já praticamente desaparecidos por aqui.
Belíssimo trecho.
Mário
Este texto de Eugénio de Andrade é realmente muito expressivo, Mário, por isso o escolhi para acompanhar a imagem da planície a perder de vista, mesmo sem as mulheres de luto a fazerem, no presente, parte da paisagem.
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