4 de janeiro de 2010
O HOMEM QUE CAMINHAVA SÓ
No dia 4 de Janeiro de 1960, Albert Camus morria num acidente de viação, numa aldeia próxima de Yonne, no centro de França.
Verá mais tarde José Cardoso Pires falar do absurdo insupoortável da morte de Camus quando escreveu que sempre recordaria a capa do “Paris-Match” noticiando a morte prematura do escritor.
Quandoo Camus morreu, ele tinha 15 anos e ainda não lera “O Estrangeiro”. Acontecerá uns dois anos depois, e esse livro, Camus no seu todo, há-de marcá-lo, Hoje já não sabe quantas vezes o leu, por inteiro ou folheando, aqui e ali, páginas soltas, demasiado marcadas e riscadas para que não saiba onde encontar as que quer reler.
Jean-Paul Sartre, no ensaio “Explicação de “O Estrangeiro” resume:
“Como deveria interpretar aquela personagem que, um dia depois da morte de sua mãe, “tomava banhos, iniciava uma ligação irregular e ia rir-se diante de um filme cómico”, que matava um árabe “por causa do sol” e que, na véspera da sua execução capital, afirmando que “fora feliz e que o era ainda”, desejava ter muitos espectadores à roda do cadafalso para o “acolherem com gritos de ódio?”
Albert Camus e Jean-Paul Sartre.
Numa célebre polémica que mantiveram, Sartre escreverá que a amizade entre os dois não era uma coisa fácil. Muitas coisas os uniam, poucas os separavam, mas este “pouco” era muito grande. Demasiado, mesmo.
Urbano Tavares Rodrigues encontra-se com Albert Camus nos escritórios da Gallimard,têm uma longa conversa que Urbano faz publicar no “Diário de Lisboa”:
“Tenho diante de mim, sereno e triste, um homem honesto e “só”, abandonado, atacado, exultado, caluniado, uma das grandes e nobres figuras do nosso século, até para os que dele discordam politicamente; um homem sempre desejoso de justiça, mas também de tolerância, defensor dos fracos e dos oprimidos, da arte e da liberdade, figura poética e não obstante poderosamente lógica no nosso mundo apaixonado pela violência e pela eficiência mecânica. Camus tem combatido e negado o obscurantismo cruel que se diz ou se acredita ao serviço da justiça e da liberdade. Tem-se oposto ao servilismo do comunismo imperialista de certos intelectuais de esquerda, “fascinados – como ele próprio denuncia – pela força e pela eficácia”, tal como os nazis de há quinze anos. Camus desmente os que o acusam de haver renegado a esquerda: a esquerda para ele é ainda hoje e será sempre a oposição à tirania. Não aceita o argumento dos defensores da Rússia soviética, segundo os quais o sentido da história tudo justifica. Para Camus a opressão é sempre opressão: não há carrascos privilegiados.”
Albert Camus escreverá em “A Queda”: "quando todos formos culpados, será a democracia.”
Uma frase marcante metida no contexto de um livro também ele marcante.
Dinis Machado no seu “Reduto Quase Final” dedica, a essa frase, todo um capítulo. E à frase voltará no recente regresso de Dennis McShade, quando no final de “Blacpot” não deixa de escrever:
“Victor foi com a mão, maquinalmente, à estante, e retirou de lá “La Chute”, de Camus. Abriu o livro e leu pela milésima vez a frase que mais odiava: “Quando todos formos culpados então será a democracia”.
Maria Teresa Horta, em “A Capital” 18 de Fevereiro de 1970:
“No dia 4 de Janeiro de 1960 morreu Alber Camus, com 47 anos de idade.
Numa estrada deserta a meio de uma madrugada igual a tantas outras que vivera ardentemente durante o seu período de resistência. Albert Camus encontrou, talvez, na morte, o gozo de algo que afinal sempre tivera na pele como um vicio doloroso”.
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1 comentário:
Caro Gin-tonic,
Hoje, também evoquei Camus! É ponto de encontro espiritual definido pela comunidade do Saber e da Cultura de que, à minha medida (simples), gosto de pensar que faço parte.
Panteão(como consta) ou não, isso é irrelevante! O que importa não é saber onde repousará o Escritor! O importante é que as pessoas se façam 'Gente' aproveitando os ensinamentos que ele legou ao mundo, o qual sofreu com a sua morte, uma perda pessoal significativa.
O meu Caro Gin, neste post, biografou de uma forma excelente e incontornável um dos grandes vultos do século XX.
E gostei de saber que ele passou pelo "crivo" de outra figura incontornável da Cultura portuguesa: Urbano Tavares Rodrigues!
Como disse, a perspicácia deste grande senhor assim definiu Camus: «Tenho diante de mim, sereno e triste, um homem honesto e "só"!...
- Tão assertivo, como o que confirma Catherine - filha de Camus - recordando uma pergunta feita ao pai, tendo-o visto um dia mais abatido: «Estás triste, papá?»
Respondeu: « Não, estou só!».
Comovente..., mas lindo!
Obrigado, pelo que aprendi consigo neste seu tabalho!
Um abraço e
Até Sempre...
César Ramos
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