10 de outubro de 2009
Manhãs que cantam
Como são apelativas certas manhãs de Outono. A luminosidade é diferente e o dia convida a caminhadas. Todos os dias – desde que o tempo o permita – é bom passear junto do pinhal com o seu aroma inconfundível. Apesar da óptima estrada que incentiva condutores a acelerar, ainda não senti a necessidade de caminhar ao som da sinfonia número 6. Por enquanto, como as aves ainda não debandaram, ouvi-las neutraliza o desagrado causado pelo ruído dos motores. E os pinheiros a crescerem em liberdade remetem para tempos imaginários, universo ficcional do rei Artur, de Percival, de Galaaz (e aqui serei suspeita, pelo fascínio da literatura do ciclo arturiano). No caso pessoal é difícil conceber movimento com sacrifício – os que se esforçam em ginásios, que correm junto ao fumo dos escapes, que pedalam por montanhas sentindo o cansaço logo ao fim dos primeiros minutos de exercício ...até pode ser que apreciem, mas não os consigo etender. Quando já se viveu uma boa parte da vida – apesar do privilégio de trabalhar naquilo de que se gosta – torna-se um absurdo fazer coisas contrariada, a não ser quando é mesmo obrigatório e aí há que inventar algumas estratégias de evasão.
Já de regresso a casa, mais uma vez lá estavam estes cavalos escanzelados, apesar de junto a eles se encontrar sempre água e comida. O aspecto incomoda, tendo-me interrogado por diversas vezes sobre a causa do estado débil que aparentam. A imagem trouxe à memória o poema de Nicolau Tolentino, poeta que sempre surpreendeu pela inovação dos temas escolhidos, como é também o caso do famoso “Colchão dentro do toucado”:
Vai, mísero cavalo lazarento
Pastar longas campinas livremente;
Não percas tempo, enquanto tu consente
De magros cães faminto ajuntamento:
Esta sela, teu único ornamento,
Para sinal de minha dor veemente,
De torto prego ficará pendente,
Despojo inútil do inconstante vento
Morre em paz; que, em havendo algum dinheiro,
Hei-de mandar, em honra de teu nome,
Abrir em negra terra este letreiro:
— "Aqui, piedoso entulho os ossos come
Do mais fiel, mais rápido sendeiro,
Que fora eterno a não morrer de fome."
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4 comentários:
de facto, os cavalos do mato grande têm um ar triste e magro...
Quanto aos esforços em montanhas, seja de bicicleta seja a pé, a fazer o pino, todo o esforço é recompensado pela fracção de segundo em que se chega ao topo e se pensa: "consegui."
Acredito que sim, Z.
Cá por casa tenho disso prova, mesmo quando se somam os arranhões nas pernas e os desabafos 'ai que me dói aqui e ali, que bom descansar agora em casa, etc.' :)
Pelo canto das manhãs que lhe sugereiram, decidiu, ontem, sair porta fora à procura do dia claro. Encontrou-o. Agora é só o tempo de reunir as fotografias e... reportar..
Obrigado.
... e apesar de se dizer que não se deve ser curioso (neste caso, curiosa), fico a esperar as tais fotografias e o respectivo texto, caro gin:)
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