15 de maio de 2009

amb ulls de nena

com olhos de menina

encarnació martorell tinha 12 anos no dia 19 de julho de 1936.
estudava no grupo escolar ramon llull, exemplar do ponto de vista pedagógico, onde os professores utilizavam os livros como auxiliares de educação e não como motor dela.
uma experiência pedagógica notável que salvador doménech, um psicopedagogo catalão, decidiu estudar e, ao entrevistar antigos alunos daquelas escolas, o fez descobrir, num acaso de conversa, o diário que encarnació martorell tinha escondido no sótão da sua casa no bairro de horta, em barcelona, há 70 anos.
primeiro por medo, depois por desvalorização da sua importância.

encarnació era uma miúda com imenso apetite pela escrita.
esse enorme gosto de escrever levou a que aquela escola exemplar a nomeasse 'cronista' oficial.
da sua casa no carrer diputació, às escondidas de todos (nenhum dos seus irmãos ou amigos sabia que ela escrevia quase todos os dias), escreveu um singular diário da guerra civil espanhola ao som dos bombardeamentos dos mouros, italianos e alemães.
a visão de alguém de 12 anos é sempre muito mais isenta: é a visão dos sentimentos, não nas ideologias (por muito que eu ache importante estas).
é a visão de alguém que sente que lhe estão a destruir o seu mundo:
a escola, a casa, a rua onde brinca com os amigos e que lhe criam uma nova rotina entre fugas para caves, bichas de racionamento, fome e morte dos que ama.
desde dia 19 de julho de 1936, em que inicia o seu diário
'19 de julho. não compreendo o que se passa. que espectáculo! as pessoas nas varandas e nas janelas; um trânsito intenso; um tiroteio constante. os carros estão pintados com as letras cnt-fai, ugt, ait e muitas outras' até ao dia 7 de janeiro de 1939, data da morte do seu amigo pepe bueno, uma paixão de adolescente que a deixou sem vontade de escrever, encarnació tinha uma vida dupla: aquela igual a todas as crianças da sua idade em barcelona naqueles dias, entre a escola e o dia a dia duma cidade sitiada e bombardeada e o refúgio da escrita por achar que aqueles eram acontecimentos demasiado importantes para não serem contados (aos 12 anos escreve claramente isto). e que a leva a escrever no dia do seu 13º aniversário: 'completo 13 anos. talvez sejam os últimos'

amb ulls de nena é hoje um livro, um documentário, uma fonte de ensinamentos, e um exemplo.
a não esquecer.
nunca.

ver aqui o filme:

amb ulls de nena

5 comentários:

Anónimo disse...

els llibres que parlen d'una guerra sempre tracten les causes que la van provocar, els aspectes polítics... però segurament és amb llibres com aquest, que podem conèixer la realitat que vivia la gent de barcelona en aquells dies. és amb llibres com aquest s'aprèn que no podem oblidar tot el que persones com l'encarnació van viure.

teresa disse...

Interessante o post, desconhecia a existência do livro e da autora, dado só o diário de outra jovem(neste caso judia) a viver uma situação de guerra, ser amplamente divulgado e ter direito a casa-museu em Amsterdão.

Anónimo disse...

teresa, este caso tem uma série de particulariedades interessantes:
a miuda escrevia escondida, mas tinha as mesmas rotinas diárias de todos os miudos: desdes as bichas de racionamento, às correrias sob as bombas e à vida na escola.
e as paixões de adolescente que ainda hoje lembra a dor da perda de 'pepe' bueno.
e poder-se falar com ela hoje.
e também saber da dureza da sua vida depois da guerra com um
filho a morrer ainda muito criança e do abandono pelo marido quando viu que o segundo filho nasceu deficiente e ela teve que carregar o fardo sózinha.
e olhar hoje para esse adulto é recompensador.
e o conhecimento da experiência pedagógica nos primeiros tempos da república espanhola.

ste caso é um manancial de informação. um rico filão de conhecimento disposto a ser explorado.

Isabel O disse...

Boa tarde
Cheguei hoje ao seu blogue procurando imagens para um roteiro de trabalho (para acompanhar a exposição "A Escola no Estado Novo", que temos na biblioteca). Estou a achá-lo interessantíssimo. Tenho que voltar com mais tempo.
Moro em Setúbal. Gostei dos seus postes sobre a cidade, ainda que de um passado que não conheci.

T disse...

Bem-vinda Isabel O. Volte sempre. Um abraço em nome de todos.