17 de junho de 2008

o 30

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o 30 foi uma das casas mais famosas do bairro.
no tempo em que havia casas famosas tratadas pelo seu número de porta como se de nome próprio se tratasse: o 30, o 11, o 100.
eram muitas e espalhadas generosamente pelo bairro.

durante um curto periodo da minha vida, que coincidiu com a entrada no mundo do trabalho, tinha que levar comida a várias dessas casas.
as suas ocupantes, por estarem muito ocupadas, ou por não serem muito bem vindas nos restaurantes do bairro, preferiam comer dentro de casa.
era o tempo da 'meia-porta', das 'casas de passe' ou simplesmente das 'casas'.

de todas, era o 30 a mais famosa.

e dentro do 30, era a teresa a sua rainha.
a teresa do 30 era uma espécie de lenda no bairro.
a história que ainda hoje me corre pela memória é a de uma senhora bem casada e que usava a profissão como uma espécie de necessidade física.
contavam-se as coisas mais fantasiantes e fantasiadas. algumas presumo que verdade. resta saber quais.
mas por lá aparecia um senhor tratado por marido. que toda a gente assumia que fosse.
quando li o 'milagre segundo salomé' sempre tive na cabeça o 30 e a teresa como modelo identificador.
para um irmão meu com quem este fim de semana falei sobre o assunto, e que também conheceu (melhor que eu) a teresa e o 30, era mais uma séverine serizy ('a perfeita belle de jour' do buñuel) espantando o tédio da vida burguesa bem casada. na verdade ela não fcava para as noites.
mas aos 10 anos acreditamos em quase tudo. principalmente no que fantasiamos.

a porta de entrada pareceu-me mais pequena do que o hall da escada que eu atravessava para chegar à porta do rés do chão.
a porta aberta para dar visão para a sala de estar e espera à esquerda e corredor comprido em frente que escondia as entradas dos quartos.

este fim de semana, aquele prédio pareceu-me bem mais estreito que o corredor comprido que me lembrava.

quando as 'casas' foi ilegalizadas, algumas delas transformaram-se em pensões.
mas o mistério tinha desaparecido. e o encanto também.
mesmo que a maior parte das vezes que levava comida a uma dessas pensões, na rua da rosa, em frente da farmácia e bem ao lado do armazém da 'brincotécnica', a jovem senhora que quase sempre me recebia em camisa de noite (ou de trabalho) transparente, fosse uma visão de sonho para a minha jovem adolescência.

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