5 de maio de 2007

O campismo na cidade e o urbanismo no campo

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"Nós criámos o camping urbanizado, asseadinho, escovado com água e moral encanadas, esquadra de polícia, correio, rega, caixote de lixo e arame farpado. Usamos fogões de algibeira a gás Cidla, com abundância de sardinhas Nice, fiambre do Isidoro e fados da Amália. Não haverá nele qualquer encanto imprevisto, isolamento, paisagem deserta, montanha inóspita, riacho poético: teremos antes o bloco campestre, urbanizado, o bairro caracol, em que as famílias carregam com as casas- as barracas de lona desses vastos Lona-Parques e acampamo-las com perfeita ordem e disciplina, sobre a relva com agentes de trânsito e cobradores de impostos (e talvez algum pedinte para dar cor local). Sorveremos a natureza com perfeita conduta social e dormiremos ao relento com a lei à cabeceira e a taxa turística debaixo da cama de campanha ao pé da baixela de urgência. Sentir-nos-emos homens Tarzan de cintura para cima, segundo o regulamento, e as nossas mulheres mais ou menos "mamute" (nesse saltitante primitivismo da vida paradisíaca reconhecido oficialmente por decreto com força de lei)."
Leitão de Barros, com ilustração de João Abel Manta
"Os corvos"

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