9 de dezembro de 2006

Carros, deboche e encantamentos


"O quotidiano é uma talagarça onde pouco a pouco a vida se vai bordando a personagens, incidentes,inquietações e alegrias. As tipóias sobem a rua a trote, atrás delas os garotos descalços correm esbaforidos . "Dê-me um penny! um penny!" E os câmones riem-se, corados e atiram moedinhas, gostam de ver os meninos engalfinhados a disputá-los.
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Cuidado não atravesses a rua sem olhar para os lados!Vem lá um mata-gente! Ficam a olhá-lo, assombrados: tem umas grandes lanternas amarelas, a capota presa com correias que oscilam ao ventos, a buzina é rouca. Fede que mata, enche a rua de fumarada. A gente foge mas sente-se irresistivelmente atraído. O Santiago conhece as marcas todas: Peugeot, Minerva, Panhard Levasseur, Berliet...O Automóvel é a grande novidade do dia. O dono do hotel também tem um, vimo-lo à porta, aberto e trepidante: andam sempre numa pândega rasgada: Sintra, Cascais , o Estoril, mulheres, jogo, deboche...Tem uma quinta qualquer nos arredores, que o Gabriel confunde com uma (Cardiga ou Formiga?) onde a polícia foi encontrar uma data de mulheres nuas a puxar à nora, debaixo do chicote...A conversa morre, não há maneira de se entender bem. Segredos de gente crescida. Mas as garages parecem igrejas, muito limpas, cheiram a borracha e a gasolina apetece ir para lá brincar"
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José Rodrigues Migueis, Escola do Paraíso,
Memórias do autor na época da primeira República

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