27 de janeiro de 2006

a árvore a a floresta

as recentes eleições na palestina espantaram o mundo.

já se escreveram as coisas mais delirantes e mais deslumbrantes sobre o resultado obtido pelo hamas, que desta vez decidiu concorrer às eleições.

sem pretender perceber mais da palestina que os palestinófilos, gostava de dar umas achegas para se olhar de um outro modo para os resultados obtidos pelo hamas:

1.
o hamas é sempre e apenas apresentado como um bando de terroristas que se dedica a sacrificar alguns 'mártires' e a matar indiscriminadamente alvos militares (poucas vezes) e civis inocentes (a maior parte delas).
no entanto, o hamas é muito mais que isso:
para além de ter uma estrutura organizativa muito aperfeiçoada e espalhada por todo território palestiniano, utiliza essa estrutura para um complexo sistema de ajuda aos mais pobres e desfavorecidos, recebendo assim o reconhecimento de uma larguíssimas parte do povo palestiniano, mesmo dos que não concordam com as suas actividades suicidas e mortíferas contra alvos israelitas. desde a saúde ao ensino, o hamas tem vindo a realizar um trabalho enorme em todo o território da palestina. o resultado está à vista neste momento.

2.
as recusas do hamas em participar nas anteriores eleições, e o seu afastamento da esfera governativa, deram-lhe um capital próximo daquele que permitiu o cavaco ter sido eleito presidente (agora é o gajo se esticou, dirão vocês...):
o facto de ir construindo uma linguagem de afastamento da actividade governativa e dos partidos, com aquele ar de quem não quer o poder nem o governo e que quer mesmo é trabalhar nos 'problemas concretos' fez com que capitalizassem todos os votos dos descontentes destes anos de construção do estado palestiniano. descontentamento esse provocado por razões de real inacção e/ou corrupção da fatah e outros decorrentes dos obstáculos colocados pelo estado de israel e do próprio hamas que sempre dificultou a vida à fatah.
do mesmo modo, vem mostrar que quando israel e os estados unidos condenavam a fatah por não 'querer ter mão' no hamas, já aquilo era um pequeno bando de terroristas, era uma visão completamente distorcida da realidade. o hamas é muito mais que um bando de terroristas.

3.
claro que o hamas agora vai para o governo e não vai ser fácil manter, por um lado a atitude de culpar a autoridade palestiniana (isto é, a fatah) de nada se fazer, porque agora a responsabilidade é deles, e por outro lado, terão obrigatoriamente que dialogar com todos os parceiros da região. israel incluido.
as relações comerciais, laborais, culturais e de todo o dia a dia dos povos da palestina e de israel são muito mais interdependentes do que aquilo que ambos os lados se esforçam por mostrar ao mundo.

4.
finalmente registo as reacções do mundo ocidental ao resultado das eleições.
como não ganhou quem queriam e esperavam... parece que afinal já não valem e quem ganhou não tem legitimidade para representar o povo que os elegeu.
mas, como sempre tem acontecido naquela região, o que agora é verdade, daqui por 5 minutos já poderá não o ser. a fatah era um bando de criminosos terroristas há poucos anos, e hoje os ocidentais e israel já dizem que eram o garante do processo de paz. do mesmo modo que o sharon era um criminoso (era mesmo) até ao ano passado e hoje é visto como o salvador da paz e o único homem capaz de trazer a paz às margens do rio jordão.

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