8 de janeiro de 2010
EM VIAS DE EXTINÇÃO
Por finais de Setembro, faça chuva, faça sol, passa sempre uns dias em São João da Caparica, hábito antigo, reminiscências das férias da infância passadas na Trafaria, quando a Trafaria era uma vila de pescadores.
Gosta das praias no tempo em que as marés vivas espalham pelo areal pedaços de madeira e ainda não desistiu de um dia encontrar uma mensagem numa garrafa. Gosta das praias longe do bulício do Verão. Alguém lhe disse que quem gosta de praias não as escolhe no Verão.
Ruy Belo tinha opinião contrária, o Verão é que é a estação, ou o Rainer Maria Rilke a dizer que só o Verão valia a pena.
Razões várias levam-no a preferir assim. Dá-se pessimamente com o calor, principalmente o de Agosto, um mês que, juntamente com Janeiro e Fevereiro, se pudesse, anularia do calendário que o rege.
Nos finais de tarde do findar de Setembro o que ele gosta mesmo é da faina dos pescadores à beira-mar. Aquele ir e voltar da lancha, aquele lançar, puxar redes, escolher os peixes, os nobres para um lado, lulas, chocos, polvos para outro, e outro lado ainda para os diversos. O voo das gaivotas em redor dos barcos, os seus gritos, que o remetem sempre para “Os Pássaros” do Hitchcock para o comportamento das aves em Bodega Bay.
Calculam, certamente, o gozo de comprar aquele peixe, que ainda salta quando se chega a casa, que se come sem que tenha visto ponta de frigorifico.
Prazeres simples, os melhores.
Chama-lhe pesca de cerco mas o nome correcto é xávega uma das mais antigas artes de pesca da costa portuguesa.
Mas agora, or causa do Programa Polis da Costa da Caparica, os pescadores de São João da Caparica, foram deslocados para o extremo sul da zona, não podendo pescar na frente urbana das praias, tão pouco às horas que entendem que devem pescar. Limitações que eles consideram lesivas da sua liberdade, porque são eles que sabem as horas e os sítios dos peixes, e não os tipos do ar condicionado que fazem as leis e os regulamentos. “Alguns só sabem do peixe quando o vêem no prato”.
Setembro do passado ano, em conversa, ficou a saber que a arte xávega, pelo menos em São João da Caparica, caminha para a extinção.
“Muito o trabalho, pouco retorno e agora as restrições da capitania”, disseram-lhe.
As fotografias foram tiradas em São João da Caparica, Setembro 2006.
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1 comentário:
gostei da expressão "os tipos do ar condicionado" e esta história fez-me lembrar outra que li recentemente: numa enorme reserva africana com densidade populacional de 6 pessoas por km2 é ilegal a caça de subsistência...!
espero que os tipos do ar condicionado estejam em vias de extinção... ;)
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