23 de maio de 2009
COISAS DO SÓTÃO
Algumas revistas marcaram-lhe a educação cívica e politica.
Já aqui falou da “Seara Nova”.
A recente morte de João Bénard da Costa levou-o a ir ao sótão buscar um número de “O Tempo e o Modo” Nº 69/70, Março/Abril de 1969, precisamente aquele em que António Alçada Baptista (1927-2008) deixa a direcção da revista e é João Bénard da Costa que assume o cargo.
Segundo João Benard da Costa, em artigo publicado no “Diário de Notícias” de 9 de Novembro de 1983, “Os negócios de António Alçada Baptista não corriam nada bem e “O Tempo e o Modo” era uma amante caríssima (ainda por cima mais minha do que dele)”.
Em 1967 Bénard propôs uma sociedade por quotas, ficou como director e abriu mais à esquerda, a embriões do MRPP. Passaram-se “seis meses bons” e depois começaram as discussões. A ruptura deu-se quando os maoistas, liderados por Amadeu Lopes Sabino, quiseram arrasar um livro de António José Saraiva sobre o Maio de 68. Bénard opôs-se, foram a votos, ele perdeu e saiu. Dirá mais tarde que essa saída lhe custou “muito”.
A abrir este número de Março/Abril de 1969 pode ler-se:
“António Alçada Baptista dirigiu O TEMPO E O MODO desde o seu primeiro número, em Janeiro de 1963, durante mais de seis anos. A ele se deve esta iniciativa e a ele se deve a vida que O TEMPO E O MODO já viveu.”
No editorial de despedida António Alçada Baptista reconhece que “durante estes seis anos, O TEMPO E O MODO foi muito mais obra de João Bénard da Costa do que minha. Foi ele, no fundo, que deu à revista a sua orientação e o seu conteúdo.”
No artigo do “Diário de Notícias” atrás citado, João Benard da Costa confessa. “Se julgo que fui um bom chefe de redacção durante seis anos, fui um mau director durante pouco mais de um.” E mais à frente: “Como não sei o que aconteceu ao título e à revista que a última vez que a vi (Já depois do 25 de Abril) era órgão oficial, ou oficioso, do grande educador da classe operária.”
Este número de “ O Tempo e o Modo” é, na sua quase totalidade, uma homenagem a António Sérgio, que morreria em Janeiro de 1969, mas a homenagem fora planificada ainda em vida de António Sérgio.
Depoimentos de Joel Serrão, Eduardo Lourenço, Vasco Pulido Valente, A. H. de Oliveira Marques, António Alçada Baptista, Carlos da Silva, Fernando Lopes Graça, Fernando Piteira Santos, Henrique de Barros, Jaime Gama, hoje Presidente da Assembleia da República, João Bénard da Costa, Jorge de Sena, José Cardoso Pires, José Gomes Ferreira, José Medeiros Ferreira, Manuel Mendes, Manuel Sertório, Alberto Costa, hoje ministro da Justiça do governo de José Sócrates.
Este número tem ainda uma entrevista, conduzida por Deniz Cintra, com o cineasta João César Monteiro que acabara de fazer um filme sobre Sophia Mello Breyner Andresen. Diz o João César Monteiro:
“Ninguém morre por não fazer filmes e se morre é idiota. Não vale a pena.
O cinema não é mais que um itinerário que instaura o reencontro do homem consigo mesmo. Ou Ulisses de novo em Itaca.
Você consegue levar a sério um senhor realizador que tem vinte e cinco tostões no bolso”.
Na secção de opinião há um artigode Arnaldo Matos, futuro dirigente do MRPP, com o título “Paquistão: Uma revolução adiada”.
Ainda segundo João Bénard da Costa: “Quer enquanto consciência política, quer enquanto consciência ética, quer enquanto consciência estética, não se pode fazer a história dos anos 60 – acho eu – ignorando esta revista.”
Mais um pormenor. Num depoimento escrito em 31 de Dezembro de 1989 António Alçada Baptista conta: “encontrei na rua um leitor anónimo que me disse: “Dou-lhe os parabéns pela sua revista. Sabe, eu não sou assinante mas compro sempre nas livrarias, porque tenho medo que vá lá a PIDE buscar o ficheiro dos assinantes.”
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