24 de dezembro de 2008

LADAINHA DOS PÓSTUMOS NATAIS



“Há-de vir um Natal e será o primeiro
em que se veja à mesa o meu lugar vazio

Há-de vir um Natal e será o primeiro
em que hão-de me lembrar de modo menos nítido

Há-de vir um Natal e será o primeiro
em que só uma voz me evoque a sós comigo

Há-de vir um Natal e será o primeiro
em que não viva já ninguém meu conhecido

Há-de vir um Natal e será o primeiro
em que terei de novo o Nada a sós comigo

Há-de vir um Natal e será o primeiro
em que nem o Natal terá qualquer sentido

Há-de vir um Natal e será o primeiro
em que o Nada retome a cor do Infinito

David Mourão-Ferreira in “Obra Poética”

4 comentários:

teresa disse...

Curiosamente, esta manhã tinha decidido "postar" o poema do mesmo autor "Litania para o Natal de 1967". Aquele que começa:
"Vai nascer esta noite à meia-noite em ponto
num sótão num porão numa cave inundada". Ao ver que já cá constava "um Mourão-Ferreira", fiquei-me pela fotografia do presépio em versão simplificada:)



Tendo espreitado primeiro as novidades do dia, fiquei-me

teresa disse...

(as 2 linhas de baixo estão "por excesso")(é de pensar nos doces natalícios) (risos)

gin-tonic disse...

Também um bonito poema, Teresa. Aliás o David Mourão-Ferreira é o poeta que mais dedicou a sua poesia ao tema do Natal. A dificuldade está na escolha. Optou pela "Ladaínha dos Póstumos Natais" pela sua profundidade, pela sua sensibilidade e porque foi escrito num tempo em que já andava a despedir-se da vida. E dê as voltas que der, sempre que o lê, fica com uma nostalgia do tamanho do mundo. E já o leu muitas e muiras vezes.
O seu lugar vazio à mesa.

teresa disse...

... e foi um lutador, acompanhando os seus alunos de mestrado até aos últimos tempos da sua doença. Vivi idêntica situação com a minha querida professora Leonor Buescu, uma lição de vida para mim, tendo-me também acompanhado apesar de a saúde lhe faltar de dia para dia.
Quando me lembro de exemplos assim, sinto-me envergonhada quando começo a reclarmar por ninharias.