11 de fevereiro de 2006

a cabeça (do meu) patrão

A cabeça do patrão
Sobre a travessa decorada
Com rodelas de limão
A fumegar, bem escaldada
Eis a cabeça do patrão.

Jaz de pálpebras cerradas
Branca em fundo colorido
E pequenas fumaradas
Saem do crânio fendido.

Cruzam-se-lhe na testa alvar
Veiazinhas às dezenas
Que a luz parece tomar
Tal qual pálidas verbenas.

A língua aos poucos inchada
No seu banho de vapor
Parece, azul, granulada
O queixo de um velho actor.

A queixada ainda inteira
Envolta em fumaças finas
Mostra o arroz da mioleira
E as cavidades intestinos.

Duas rosas em poupa
Sobre a âncora do focinho
Parecem a crista ou a roupa
De um fabuloso estorninho.

Sobre a travessa decorada
Com rodelas de limão
A fumegar, bem escaldada
Eis a cabeça do patrão.

Segundo Gabriel Párvulo, poeta contemporâneo.

in A Cozinha Canibal, Roland Topor

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