26 de outubro de 2005

a propósito de mouros e celtas, ou de onde vêm os lusitanos



ontem, no poste sobre a conquista de lisboa e a mistificação do 'acto' do martim moniz, alguém comentou sobre a limpeza étnica na futura capital, e posteriormente sobre os povos que originaram os actuais portugueses.

convém esclarecer algumas coisas:
tirando o facto de a conquista de lisboa ter sido uma carnificina notável (coisa um bocado normal naquela época), os 'mouros' conquistados e sobreviventes ficaram na sua quase totalidade a morar em lisboa.
aconteceu assim em lisboa, como aconteceu nas restantes cidades 'reconquistadas''.
em boa verdade, os habitantes da lisboa 'moura' eram descendentes de habitantes, de há muito tempo, da península e não mouros originários do norte de áfrica.
o que se passou foi que, com a conquista, se converteram à cultura e religião muçulmana.
os 'reconquistadores' sabiam isso muito melhor do que parece saber-se hoje.
lisboa é tão moura como fenícia, ou visigótica, ou celta, ou ibérica.
o que se passa em lisboa e no sul, passa-se no norte de portugal.
achar que os do norte são celtas e os do sul são mouros é uma ideia tão abstronça quanto estulta.
qualquer leitura, mesmo pouco atenta, pela história da ocupação do rectângulo torna claro que a mistura de povos neste espaço foi sempre imensa.
os do norte não são celtas por haverem gaitas de foles em trás os montes.
nem a gaita de foles é um instrumento celta.
é um instrumento que os povos de origem celta também tocam.
(aliás o conceito de música celta é outra abencerragem estranha: sabemos tanto o que os celtas tocavam ou cantavam.... como não sabemos o que os lusitanos cantavam...)


o espaço actualmente ocupado por portugal, por ficar no extremo da europa, serviu como tampão para todos os povos que se deslocavam do frio centro da europa em busca de melhores terrenos e climas.
chegados ao atlântico paravam porque a água estava fria e ainda não tinham sido informados do truque de caminhar sobre as águas....
e aqui ficaram.
e aqui se misturaram.
se se derem ao trabalho de, por exemplo, visitar odrinhas. facilmente verificarão a quantidade de cemitérios de vários povos que se foram sobrepondo.
como qualquer escavação por esse país fora, de norte a sul, pode facilmente confirmar a amostra

ontem falava do mito do martim moniz.
hoje posso falar do mito do viriato.
a diferença é que se o martim moniz existiu, o viriato na serra da estrela é invenção pura e dura. o homem terá habitado na estremadura espanhola e no alto alentejo.
mas deu jeito à ideia de 'um povo, uma nação' e com o símbolo a viver no seu ponto mais alto, na sua estrela.

somos, de facto, um povo e uma nação (coisa não muito comum na europa). mas este povo nasceu de muitos povos.
aqui se misturou. aqui se tornou numa coisa nova.
os celtas, os iberos, os visigodos, os mouros, os iberos, os lusitanos. todos, mas todos, se misturaram.
todos, mas todos andaram por norte e por sul.
eu não sou lusitano por toda a minha família, incluindo eu, ter nascido no espaço geográfico a eles atribuido...


falar de celtas a norte e mouros a sul é da família do 'no norte trabalha-se e no sul coçam-se tomates'.

falar de celtas a norte e mouros a sul é não perceber a ponta dum corno da história da ocupação do rectângulo.

falar de celtas a norte e de limpezas étnicas a sul é... ok, não vou dizer...

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